A liberdade longe do Supremo
ANTÔNIO CLÁUDIO MARIZ DE OLIVEIRA
FOLHA DE SP - 13/07/11
Vejo como demonstração de pouca convicção no acerto e na própria legalidade da PEC dos recursos a afirmação de que, se ela estivesse em vigor, Pimenta Neves já estaria preso há tempos.
Sabem os que assim alegam que esse é um argumento apenas de efeito para uma sociedade leiga e sedenta pela prisão alheia, pois não corresponde à realidade de nosso sistema penal. Pimenta Neves poderia, sim, estar encarcerado, mesmo na vigência do atual sistema, se a sua prisão fosse considerada necessária pelos magistrados que examinaram o seu processo.
Poderia ter sido preso, como o foram, antes do trânsito em julgado das decisões, inúmeros outros acusados de homicídio, dentre os quais Suzane von Richthofen, os irmãos Cravinhos e o casal Nardoni. Portanto, não são os recursos que impedem a prisão.
Fala-se também que os advogados são contrários à PEC por razões de interesse profissional. Alegação imprópria e injusta. Como fizemos na luta pela democratização do país, pelo término da censura e pelo retorno das prerrogativas da magistratura, nós, advogados, outra vez pugnamos pelo que nos parece correto, no caso, a liberdade.
Aliás, se fossem levados em conta motivos meramente profissionais, deveríamos estar a favor da PEC, pois na área criminal a demanda será maior, uma vez que, por conta do trânsito em julgado antecipado, inúmeros habeas corpus serão impetrados.
Argumentos dessa natureza não podem alicerçar uma medida que suprimirá dos tribunais superiores questões como a liberdade e a dignidade do homem. Note-se que, com a PEC, o tribunal que ficará sobrecarregado será o Superior Tribunal de Justiça, pois os habeas corpus serão a ele dirigidos. Observe-se, sobre o habeas corpus, que ele só poderá ser interposto após a expedição do mandado de prisão em segundo grau, não tendo, portanto, o condão de impedir que a liberdade seja sacrificada.
Não se pense, no entanto -e seria grande indelicadeza fazê-lo-, que o objetivo da PEC foi aliviar o STF em detrimento do STJ.
Em verdade, na busca de soluções para aliviar a sobrecarga do Judiciário, é preciso levar em conta suas causas reais, que não são os recursos, mas, sim, a burocracia, a carência de juízes e de funcionários, a inexistência de efetiva autonomia financeira, a incipiente informatização e, especialmente, a excessiva litigância da União.
Como pretendem incluir medidas pertinentes ao Judiciário em um novo Pacto Republicano, é conveniente e oportuno que dele se faça constar um compromisso da União de não utilizar recursos meramente protelatórios. Com isso, uma causa real da sobrecarga dos tribunais superiores será afastada, sem que seja suprimido da sua apreciação o valor fundamental do ser humano, que é a liberdade.
ANTÔNIO CLÁUDIO MARIZ DE OLIVEIRA é advogado criminal. Foi presidente da OAB-SP (1987-88 e 1989-90) e secretário de Justiça e Segurança Pública do Estado de São Paulo (governo Quércia).
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