Um mês cinzento para a ética na política
EDITORIAL - VALOR ECONÔMICO
Valor Econômico - 04/05/2011
Para o leitor atento, certamente não passou despercebido que a mudança de governo em Brasília em nada contribuiu para o aperfeiçoamento dos bons costumes na política nacional. Pelo menos três episódios sucessivos saltam aos olhos e têm muito mais em comum do que parece à primeira vista, apesar da diferença dos atores envolvidos.
Começando pelo fim, o PT reabilitou com honra, no fim de semana, o ex-tesoureiro de campanha do partido, Delúbio Soares. Difícil medir a indignação da sociedade, aparentemente resignada ou sentindo-se impotente para reagir à sucessão de escândalos que gradativamente mina a base moral da política brasileira, em todos os três níveis do poder federal.
Afinal, o que mudou entre 2005, quando o PT julgou que havia razões mais que suficientes para expulsar Delúbio do partido, inclusive com alguma dose de humilhação, e 2011, quando Delúbio ainda responde pelos crimes de corrupção e formação de quadrilha em processo no Supremo Tribunal Federal (STF)?
Como ex-tesoureiro do partido nas campanhas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o companheiro Delúbio atravessou esses anos todos fazendo questão de lembrar aos camaradas petistas que é um profundo conhecedor das entranhas partidárias. E, no entanto, cumprira obsequioso silêncio tanto na campanha da reeleição de Lula, em 2006, quanto na eleição de Dilma, em 2010.
Para voltar, Delúbio fez chantagem. Ele voltou, no entanto dificilmente recuperará o prestígio de que dispunha quando passava o chapéu entre o empresariado, mas é perturbador que o PT, um partido que na oposição ajudou muito a melhorar a ética na política, cada vez mais se pareça com as siglas do passado, que combatia com fervor religioso.
À exceção de José Dirceu, é bom lembrar, o partido absolveu todos os outros camaradas relacionados no escândalo do mensalão, o suposto esquema de compra de votos em troca de apoio ao governo. A senha para o mau comportamento, a bem da verdade, partiu do próprio Lula.
Quem não se lembra das palavras do presidente, em Paris: "O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente. Eu acho que as pessoas não pensaram direito no que estavam fazendo, porque o PT tem na ética uma das suas marcas mais extraordinárias, e não é por causa do erro de um dirigente ou de outro que você pode dizer que o PT está envolvido em corrupção". Literalmente. Com a decisão tomada no fim de semana, o PT deu razão ao ex-presidente da República.
Mas a reentronização de Delúbio no universo petista não foi o único episódio a deixar um pouco mais cinzento o mês de abril, quando se fala de moral e ética na política. O autoritarismo do senador Roberto Requião (PMDB-PR) ao avançar sobre um repórter que lhe tomara declarações gravadas é apenas reflexo da conduta desregrada que há anos tomou conta do Senado e atingiu o clímax na semana passada com a indicação dos novos integrantes do Conselho de Ética da Casa.
Não importam os argumentos dos partidos, segundo os quais, há falta de disposição dos senadores em geral para compor o Conselho de Ética. Fossem um pouco maiores as preocupações com os bons exemplos, os partidos certamente encontrariam nomes que não passaram como réus pelo conselho, caso de Renan Calheiros (PMDB-AL), que recorria a uma empreiteira a fim de pagar contas pessoais. O que dizer do novo presidente do conselho, João Alberto Souza (PMDB-MA), também ele autor de decretos secretos que tantos aborrecimentos causaram a seu amigo José Sarney, então presidente da Casa, em 2009.
Um pouco antes, o mau exemplo coubera ao senador Aécio Neves (MG), o nome mais forte hoje do PSDB para uma disputa presidencial. Aécio foi pilhado dirigindo sem carteira - sua habilitação estava vencida -, algo a que qualquer mortal está sujeito, e se recusou a fazer o teste do bafômetro, direito que a lei lhe assegura.
O mau exemplo de Aécio foi sua primeira versão do incidente à imprensa, em nota contaminada pelo subterfúgio. Esperava-se mais em termos éticos e morais com a mudança de governo, torcida que esvaneceu já com a manutenção do convite a Pedro Novais (MA), o deputado que pregava suas contas num motel de São Luís no cofre da Câmara, para o Ministério do Turismo.
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