A quantificação da advocacia
WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SÃO PAULO - 16/04/11
Na OAB, com milhares de inscritos em todo o país, a variação do saber vai de quase zero a quase infinito
SE O LEITOR NÃO TIVER relação próxima com a advocacia, dificilmente terá ideia do número de candidatos a se inscreverem na OAB, na casa das dezenas de milhares.
Saberá, porém, dada a ampla divulgação, que muitos resultados do exame da Ordem são contestados em ações judiciais pelo Brasil afora. Surgem até decisões de juízes impondo aumento de certas notas, segundo "critérios" diversificados, geralmente não jurídicos.
Há argumentos, providos de uma certa lógica, contra a seleção dos profissionais pela OAB. O mais frequente: se o aluno conseguiu chegar a bacharel em ciências jurídicas, após curso regular, não cabe à OAB examiná-los novamente, proibi-los de exercer a profissão para a qual estudaram.
Parecer lógico não se confunde com ser melhor. Os exames da Ordem mostram que o nível cultural e jurídico da maioria dos formados, pelas centenas de cursos disponíveis, é baixo.
Sem a seleção por meio do exame, a defesa sofrerá com as insuficiências do defensor. Basta esse argumento para afastar a crítica.
Cabem outros exemplos. O Estado de São Paulo, o mais populoso, tem o maior número de candidatos ao exame da Ordem. Na última prova passaram de 25 mil, sendo quase 10 mil na capital.
Apesar da seleção severa da OAB-SP, o mercado de trabalho não acolherá a metade dos aprovados para as profissões do direito.
O exame se explica pelas mesmas razões que levam o pretendente a um cargo público a enfrentar, em concursos de ingresso, temas que exigem preparo cuidadoso, acima do termo médio proporcionado pela maioria das universidades.
O mesmo se diga para o Ministério Público, a Defensoria Pública, a advocacia do Estado e, óbvio, a magistratura. Afinal, trata-se de profissionais que lidam com as comunidades, o patrimônio, a liberdade, a vida, a honra, o interesse dos envolvidos na Justiça brasileira.
A necessidade ideal da estrita capacitação profissional não é satisfeita, pelo recém-formado, com os padrões atuais de exigência. O leitor perguntará: como se comprova a deficiência do padrão?
A resposta é fácil. Nos concursos públicos para a atividade jurídica, do juiz ao advogado público, o número dos rejeitados é estarrecedor, mesmo quando acolhidos em provas sem exageros para limitar aprovações. Na OAB, com milhares de advogados no território nacional, a heterogeneidade do conhecimento vai do quase zero ao quase infinito.
O leitor tem direito a, pelo menos, mais uma pergunta, questionando-me se fiz o exame da Ordem. Não, não fiz, porque quando me formei essa exigência não existia.
Um dado ajuda a dramatizar a mudança: as inscrições livres na OAB-SP começaram nos anos 30 do século passado.
Vinte anos depois, atingiram o número de 10 mil inscritos.Entre 1960 e a passagem do milênio decuplicaram e hoje devem andar próximos dos 300 mil, gerados pelo absurdo conjunto de novas escolas abertas.
O número dos últimos inscritos não retrata a quantidade de advogados atuantes. Os claros casos de inscrição a mais, por falecimento ou cancelamento, não são descontados, mas a quantificação, desacompanhada da qualidade, tornou imprescindível o exame da OAB.
A experiência ao longo dos anos, confirmada pelo Estatuto da Advocacia, em 1994, mostrou a necessidade da aprovação profissional pela entidade.
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