Ineficiência dos Correios
VÍTOR FERREIRA ALVES DE BRITO
O GLOBO - 13/04/11
Recentemente o "Jornal Nacional" divulgou reportagem sobre a ineficiência da Empresa de Correios e Telégrafos e as contingências por ela causadas, tais como atraso na entrega de faturas, ausência em lugares distantes, filas em locais de distribuição de correspondência, a ponto de o Ministério Público Federal abrir inquérito para apurar a razão do péssimo serviço prestado.
Não obstante, o Supremo Tribunal Federal, em 2008, ao decidir que a Lei do Serviço Postal (nº 6.538/78) foi recepcionada pela Constituição Federal, entendeu que a ECT ainda possui a exclusividade na prestação do serviço postal. Serviço postal este que, segundo o Supremo, constitui-se na intermediação de carta ou cartão postal, isto é, no recebimento, no transporte e na entrega da correspondência. Trata-se de uma decisão com efeitos vinculantes, cabendo aos jurisdicionados respeitá-la.
No entanto, causa espanto o ímpeto da ECT, que se arvora sobre outros serviços, que não se enquadram no conceito de serviço postal. Sob o pretexto da exclusividade reconhecida pelo Supremo, a ECT pretende impor às concessionárias de serviços públicos, tais como distribuidoras de energia elétrica, de água e de gáscanalizado, que a contratem, custe o que custar, ainda que se onere o serviço de distribuição, cujo custo deve ser repassado para o consumidor.
A ECT vem promovendo ações judiciais para impedir que essas concessionárias entreguem, através de seus próprios funcionários, as contas de consumo aos usuários dos serviços públicos. A ECT sustenta que essa entrega consistiria em serviço postal. Esquece-se, entretanto, que o serviço postal é aquele de intermediação da correspondência, entre o seu emissor e o receptor. No caso, a distribuidora de energiaelétrica, água ou gás é a emissora da conta, que é entregue pelo seu funcionário, por mão própria. Obviamente, ela não pode ser obrigada a contratar quem quer que seja, para entregar o seu documento.
Não há violação ao privilégio postal quando uma farmácia entrega remédios e a respectiva fatura no domicílio de um determinado consumidor; quando um restaurante leva a comida até a casa de um freguês, acompanhada da nota de despesas; do escritório de advocacia que entrega documentos do interesse de seus clientes através de contínuos próprios; ou, ainda, quando o florista, com seus entregadores, leva flores a uma pessoa, acompanhada de uma correspondência pessoal.
Ademais, enquanto a ECT possui o privilégio da exclusividade na prestação do serviço postal, por se tratar de um serviço público, como decidiu o STF, de outro lado, temos distribuidoras de energia elétrica, de água egás, cuja essencialidade não merece maiores delongas. Não se pode esquecer que é o mesmo funcionário quem lê o relógio de luz, faz a manutenção de rede e a religação do fornecimento de energia, e entrega a conta de consumo, de modo a baratear a tarifa de fornecimento do insumo. Foge à razoabilidade impor a majoração da tarifa, apenas para ter que contratar a ECT.
Não faria sentido o Supremo Tribunal mitigar o princípio da eficiência e da modicidade tarifária e coibir a liberdade das distribuidoras de energia, água e gás de entregarem as suas contas por seus próprios funcionários, em face do monopólio postal. Logo, deve-se respeitar a decisão do STF, sem extrapolar o limite de sua interpretação em consonância com os princípios constitucionais.
Cabe ao Poder Judiciário tolher as investidas da ECT, que inclusive já vem acionando os cartórios de títulos e documentos, para impedir que seus oficiais entreguem as notificações extrajudicias. Estamos a um passo de os Correios pretenderem impedir que os oficiais de justiça entreguem o mandado de citação aos demandados. Mas a jurisprudência de nossos tribunais tem dado o retorno que dela se espera e, em sua grande maioria, vem rechaçando a desarrazoada pretensão da ECT.
VÍTOR FERREIRA ALVES DE BRITO é advogado.
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