Desânimo para consumir
GUSTAVO CERBASI
FOLHA DE SÃO PAULO - 11/04/11
O governo não está apenas pedindo para os brasileiros moderarem o consumo; ele está mandando!
VIVEMOS TEMPOS amargos para quem está acostumando a desfrutar do crédito.
No final de 2010, as regras para financiamentos de automóveis mudaram, impondo prazos menores, entradas maiores e, consequentemente, encarecimento do crédito. Resultado: desestímulo à compra de veículos.
Para muitos, isso traduziu-se na necessidade de adiar a compra ou troca do carro, ou, então, na escolha por modelo mais modesto.
O grande aumento no preço dos imóveis e nos índices de inflação da construção indicam que também o estímulo ao financiamento da casa própria deve ser cada vez menor.
Dentro da anunciada política de austeridade fiscal e de combate à alta da inflação no atual governo, tivemos também a elevação da taxa Selic, puxando para cima os preços de todas as modalidades de crédito, desde o financiamento de imóveis até o rotativo do cartão de crédito.
Ruim para quem recorre ao crédito por falta de planejamento, desanimador para quem aluga dinheiro, mesmo conscientemente.
Não bastasse a inflação generalizada no sistema financeiro, temos agora o tsunami de dólares batendo nas fronteiras brasileiras e obrigando o Banco Central e o Ministério da Fazenda a adotarem medidas enérgicas e emergenciais de contenção do câmbio. Ai de quem quiser tirar proveito do dólar baixo! Dá-lhe impostão para todo lado!
O aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) nos empréstimos tomados no exterior e a quase triplicação da alíquota para compras em dólar no cartão de crédito não chegam a tornar essas operações desvantajosas, mas diminuem sensivelmente as vantagens.
Aliás, fala mais alto aqui o desespero arrecadatório: se os produtos e serviços brasileiros não ganham volume devido à alta tributação, a solução inteligente seria reduzir as alíquotas de impostos e não tributar os mecanismos de aproveitamento do desequilíbrio.
As várias experiências estaduais de estímulo à solicitação de nota fiscal mostram que quando todos pagam, o imposto diminui -nem que a redução seja na forma de troco, como na Nota Fiscal Paulista.
O castigo para por aí? Não. Na última quinta-feira, tivemos o anúncio da alta do IOF de 1,5% para 3% nas diversas operações de crédito mais utilizadas.
Conforme mostram as análises dos especialistas, o impacto dessa alta é pequeno nas parcelas dos financiamentos, o que não deve desestimular os compradores compulsivos e os caçadores de parcelas diminutas. Mais uma vez, a motivação principal é a arrecadação.
Mas, é evidente, o governo está dando o recado. Ele não está simplesmente pedindo para o povo brasileiro moderar o consumo -está mandando! Consumiu, leva castigo.
Com juros elevados e medidas de desestímulo ao crédito, temos de mudar nossa receita de sobrevivência. Por mais que o crédito nos proporcione a realização antecipada de sonhos, ao fazermos as contas percebemos que está bem mais vantajoso poupar para comprar à vista.
Juros altos convidam à formação de poupança, não à produção e ao consumo.
Quem pensa em formar reservas financeiras no longo prazo e optou por investimentos de risco não deve deixar de rever a estratégia, aproveitar o momento e garantir também bons negócios nos produtos de renda fixa.
A razão para isso é que as políticas de contenção não são sustentáveis no longo prazo. Podem esfriar negócios e criar oportunidades de baixas nos preços, o que resultará em boas oportunidades de negociação à vista dentro de alguns meses para aqueles que tiverem reservas financeiras com liquidez.
Como os produtos de renda fixa estão rendendo bem, são uma ótima escolha mesmo em estratégias de longo prazo.
No final das contas, é admirável a criatividade do governo em aumentar sua arrecadação. Já pensou se toda essa criatividade fosse reunida para criar maneiras de reduzir os pesados custos da gestão pública brasileira?
GUSTAVO CERBASI é autor de "Casais Inteligentes Enriquecem Juntos" (ed. Gente) e "Investimentos Inteligentes" (Thomas Nelson).
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