Solução infeliz
ANTONIO PENTEADO DE MENDONÇA
O Estado de S. Paulo - 18/04/2011
Artigo 798 do Código Civil determina que a suicídios cometidos nos dois primeiros anos da contratação do seguro a empresa não paga o capital segurado ao beneficiário
Superior Tribunal de Justiça acaba de uniformizar a posição das Terceira e Quarta Turmas a respeito de matéria que interfere diretamente no custo do seguro de vida. De acordo com artigo expresso do Código Civil de 2002, o beneficiário do seguro não tem direito ao recebimento do capital segurado em caso de suicídio do segurado nos primeiros dois anos de vigência do contrato de seguro de vida.
A razão que levou o legislador a inserir o artigo no diploma legal não foi outra que pacificar discussão antiga, que interferia nos seguros de vida, partindo do pressuposto, aliás, sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, de que a seguradora devia fazer a prova da intenção do suicida tirar a própria vida para manter a negativa do pagamento.
Com a regra do artigo 798, o Código Civil criou uma linha temporal que permite a aplicação da lei de forma objetiva. Nos suicídios cometidos nos primeiros dois anos a seguradora não paga o capital segurado.
Passado o lapso temporal, não se discutem as causas, o capital é sempre devido.
Em decisão da Terceira Turma, o Superior Tribunal de Justiça reabriu a discussão, impondo o ônus da prova como essencial para a seguradora negar o pagamento. Logo a seguir, a Quarta Turma da mesma corte votou pela aplicação da regra da carência dos dois anos prevista pelo Código Civil.
O resultado das duas votações foi o tema a ser encaminhado para a Secção, para uniformização das posições, e aí prevaleceu a tese encampada pela Terceira Câmara, no sentido de a seguradora ter que provar a premeditação, independentemente do lapso temporal previsto na lei.
Decisão judicial se cumpre. Então, nos casos concretos, daqui para frente, as seguradoras deverão pagar o capital segurado para os beneficiários de seguros de vida de suicida que se mata nos primeiros dois anos de vigência do seguro, exceto se fizer prova insofismável da premeditação do ato.
Mas se decisão judicial se cumpre, o direito avança porque as decisões, que são dadas com base na interpretação da lei, feita por juízes que podem ou não por meio delas exprimir o melhor direito, são discutidas à luz do texto legal aplicável, da abrangência da interpretação dada, da doutrina, do direito comparado, da jurisprudência majoritária e de outros fatores que podem interferir na aplicação objetiva da justiça.
No caso do pagamento do capital segurado por apólice de seguro de vida em suicídio cometido com menos de dois anos da vigência da apólice, a leitura do Código Civil, salvo melhor juízo, não me parece comportar outra interpretação que não a aplicação da regra expressamente constante do art. 798.
No caso, não há no texto do Código Civil argumento que permita prosseguir para a interpretação de uma eventual divergência entre a vontade do legislador e o texto da lei. Se assim não fosse, o artigo não seria complementado por parágrafo único que reforça a regra, impedindo outra interpretação, ao dispor que, exceto no caso da previsão do artigo 798, é proibida a inserção de qualquer cláusula excluindo o pagamento do capital segurado em decorrência de suicídio.
Por outro lado, vale lembrar que as decisões ordenando o pagamento do capital segurado nos casos de suicídio em apólice com menos de dois anos e com mais de dois anos não têm sido embasadas com os mesmos argumentos. Nos casos de suicídio cometido após dois anos de vigência do seguro a premeditação não tem sido invocada, prevalecendo a regra do artigo 798 do Código Civil. Já nos suicídios cometidos nos primeiros dois anos da vigência do seguro a prova da premeditação tornou-se obrigatória para que a seguradora não pague o capital segurado.
A matéria não é pacífica e ainda deve rolar muita água sob a ponte.
Mas o que é preciso ter claro é que, a se manter a regra uniformizada pelo Superior Tribunal de Justiça, a consequência será o seguro de vida custar mais caro, já que o suicídio agravará a sinistralidade da carteira, em nítida agressão aos demais segurados, que são a maioria a ser protegida, e que pagarão a conta.
SÓCIO DA PENTEADO MENDONÇA ADVOCACIA, PRESIDENTE DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS E COMENTARISTA DA RÁDIO ESTADÃO ESPN
Superior Tribunal de Justiça acaba de uniformizar a posição das Terceira e Quarta Turmas a respeito de matéria que interfere diretamente no custo do seguro de vida. De acordo com artigo expresso do Código Civil de 2002, o beneficiário do seguro não tem direito ao recebimento do capital segurado em caso de suicídio do segurado nos primeiros dois anos de vigência do contrato de seguro de vida.
A razão que levou o legislador a inserir o artigo no diploma legal não foi outra que pacificar discussão antiga, que interferia nos seguros de vida, partindo do pressuposto, aliás, sumulado pelo Supremo Tribunal Federal, de que a seguradora devia fazer a prova da intenção do suicida tirar a própria vida para manter a negativa do pagamento.
Com a regra do artigo 798, o Código Civil criou uma linha temporal que permite a aplicação da lei de forma objetiva. Nos suicídios cometidos nos primeiros dois anos a seguradora não paga o capital segurado.
Passado o lapso temporal, não se discutem as causas, o capital é sempre devido.
Em decisão da Terceira Turma, o Superior Tribunal de Justiça reabriu a discussão, impondo o ônus da prova como essencial para a seguradora negar o pagamento. Logo a seguir, a Quarta Turma da mesma corte votou pela aplicação da regra da carência dos dois anos prevista pelo Código Civil.
O resultado das duas votações foi o tema a ser encaminhado para a Secção, para uniformização das posições, e aí prevaleceu a tese encampada pela Terceira Câmara, no sentido de a seguradora ter que provar a premeditação, independentemente do lapso temporal previsto na lei.
Decisão judicial se cumpre. Então, nos casos concretos, daqui para frente, as seguradoras deverão pagar o capital segurado para os beneficiários de seguros de vida de suicida que se mata nos primeiros dois anos de vigência do seguro, exceto se fizer prova insofismável da premeditação do ato.
Mas se decisão judicial se cumpre, o direito avança porque as decisões, que são dadas com base na interpretação da lei, feita por juízes que podem ou não por meio delas exprimir o melhor direito, são discutidas à luz do texto legal aplicável, da abrangência da interpretação dada, da doutrina, do direito comparado, da jurisprudência majoritária e de outros fatores que podem interferir na aplicação objetiva da justiça.
No caso do pagamento do capital segurado por apólice de seguro de vida em suicídio cometido com menos de dois anos da vigência da apólice, a leitura do Código Civil, salvo melhor juízo, não me parece comportar outra interpretação que não a aplicação da regra expressamente constante do art. 798.
No caso, não há no texto do Código Civil argumento que permita prosseguir para a interpretação de uma eventual divergência entre a vontade do legislador e o texto da lei. Se assim não fosse, o artigo não seria complementado por parágrafo único que reforça a regra, impedindo outra interpretação, ao dispor que, exceto no caso da previsão do artigo 798, é proibida a inserção de qualquer cláusula excluindo o pagamento do capital segurado em decorrência de suicídio.
Por outro lado, vale lembrar que as decisões ordenando o pagamento do capital segurado nos casos de suicídio em apólice com menos de dois anos e com mais de dois anos não têm sido embasadas com os mesmos argumentos. Nos casos de suicídio cometido após dois anos de vigência do seguro a premeditação não tem sido invocada, prevalecendo a regra do artigo 798 do Código Civil. Já nos suicídios cometidos nos primeiros dois anos da vigência do seguro a prova da premeditação tornou-se obrigatória para que a seguradora não pague o capital segurado.
A matéria não é pacífica e ainda deve rolar muita água sob a ponte.
Mas o que é preciso ter claro é que, a se manter a regra uniformizada pelo Superior Tribunal de Justiça, a consequência será o seguro de vida custar mais caro, já que o suicídio agravará a sinistralidade da carteira, em nítida agressão aos demais segurados, que são a maioria a ser protegida, e que pagarão a conta.
SÓCIO DA PENTEADO MENDONÇA ADVOCACIA, PRESIDENTE DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS E COMENTARISTA DA RÁDIO ESTADÃO ESPN
Nenhum comentário:
Postar um comentário