Camelô de cátedra
FERNANDO DE BARROS E SILVA
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/03/11
Na hora de enrolar, cada um recorre ao que tem de melhor. Os políticos, além disso, são treinados para adaptar suas falas às expectativas da plateia. E nisso Lula é um mestre. Ele estreou como palestrante remunerado anteontem, apenas dois meses depois de deixar a Presidência da República.
E estreou -ganhando algo em torno de R$ 200 mil- no papel de garoto-propaganda e líder motivacional de uma grande empresa de eletroeletrônicos. Falando a executivos e funcionários, repetiu slogans publicitários e disse coisas como: "Quando a gente distribui, as pessoas vão consumir e vão comprar os produtos da LG logo, logo".
Mikhail Gorbachev, o pai da perestroika, quando deixou o governo, nos anos 90, foi requisitado mundo afora como palestrante, a preço de ouro. Há poucos anos, já escanteado pela roda da história, virou garoto-propaganda da bolsa -não a de valores, mas a Louis Vuitton. O senhor glasnost ainda preserva algum valor de mercado.
Não se sabe se Lula seguirá o mesmo caminho ou se terá o mesmo destino. Mas Lula, de certa forma, já integrou na mesma figura o político afamado e o vendedor de produtos. É o camelô de cátedra.
A lei brasileira não o proíbe de mercadejar dessa forma, embora pareça flagrante o conflito entre os interesses privados em jogo e o que se deve esperar de um chefe de Estado que acaba de deixar o cargo.
Na véspera da palestra inaugural, seu amigo Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula, dizia à Folha: "Lula é uma figura global, tem muita credibilidade. Ele vai contar sua experiência e motivar o pessoal". Essa definição das novas atribuições do ex-presidente é muito reveladora. Ela serve perfeitamente para aqueles gurus do capital e da psicologia barata que rodam o mundo com palestras padronizadas ensinando as pessoas a ganhar fortunas e gerir suas vidas. Em geral são apenas mensageiros da globalização da bobagem.
Perto deles, o garoto LG é um gênio.
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