Renúncia, um teste
DOM EUGENIO SALES
O GLOBO - 26-03/11
A ressonância diversificada que surge de pronunciamentos e atitudes eclesiais nos leva a uma ilustrativa conclusão. Somente quando servem a interesses de uma determinada tendência adquirem maior destaque nos círculos que formam a opinião pública.
Assim sucedeu com a admirável Exortação Apostólica "Catechesi Tradendae", "A catequese no nosso tempo", do Papa João Paulo II, vinda a lume em Roma, a 16 de outubro de 1979.
Todo o texto poderá ser resumido na afirmação inicial: "Nós temos um único Mestre, Jesus Cristo." Por isso, é um cuidado constante do catequista "a doutrina e a vida de Jesus Cristo. Assim, ele há de procurar não atrair para si mesmo, suas opiniões e atitudes pessoais, a atenção e a adesão da inteligência e do coração daqueles que catequiza; e, sobretudo, ele não há de lhes inculcar as opiniões próprias e as opções pessoais, como se elas exprimissem a doutrina e as lições de vida de Jesus Cristo" (nº 6).
Na catequese, importa apresentar corajosamente o que o documento denomina "exigências morais e pessoais" (nº 29). Para se obter tal objetivo, essencial a um desenvolvimento religioso e não meramente político e ideológico, "se evite reduzir Cristo à sua Humanidade e a sua mensagem a uma dimensão simplesmente terrena, mas que Ele seja reconhecido como Filho de Deus" (nº 29).
A "Catechesi Tradendae", no estilo de João Paulo II, dá normas, ainda, sobre os diversos destinatários da catequese; a revalorização das peregrinações, das missões populares, "abandonadas, muitas vezes, precocemente e que são insubstituíveis para uma renovação periódica e vigorosa da vida cristã" (nº 47); os círculos bíblicos, as comunidades eclesiais de base, "na medida em que estas corresponderem aos critérios expostos na "Evangelii Nuntiandi"" (nº 58).
Adverte sobre livros catequéticos: "quer pela omissão (...) quer, sobretudo, por uma perspectiva de conjunto demasiado horizontalista" (nº 49) (...) "misturar indevidamente com o ensino catequético perspectivas ideológicas, sobretudo de natureza político-social, ou então opções pessoais" (nº 52).
Causa angústia pensar que todo o futuro da comunidade eclesial está posto sobre esse alicerce: a catequese.
Estamos todos nós - sucessores dos Apóstolos, presbíteros, religiosos, agentes leigos da pastoral - ainda comprometidos com a hora presente? De nossa fidelidade dependerá a eficácia desse extraordinário esforço que ele faz por transmitir Cristo à Humanidade sofredora, insegura e angustiada.
A Exortação Apostólica "Catechesi Tradendae", fielmente executada, mesmo com renúncia a posições pessoais, será um teste de nossa adesão à causa do Redentor.
D. EUGENIO SALES é cardeal-arcebispo emérito da Arquidiocese do Rio.
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