Já é hora de tirar um pouco do que Lula deu?
Marco Antonio Rocha
O Estado de S. Paulo - 31/01/2011
Manchete do Estado na última sexta-feira: "Desemprego é o mais baixo em 8 anos, mas inflação corrói renda".
Um economista bem ortodoxo, clássico mesmo, diria "E daí? Uma coisa não leva à outra..?".
E do alto da sua sabedoria explicaria que menor desemprego significa mais emprego, que significa mais salários, que significa maior capacidade de consumo, que significa maior pressão sobre a demanda, sobre os preços e, finalmente, mais inflação.
E inflação, como ensinava um velho economista, também muito ortodoxo, não é exatamente elevação dos preços. A palavra inflação designa excesso de dinheiro, de moeda em circulação. Os preços elevam-se porque há excesso de dinheiro, pontificava o professor Hayek, Prêmio Nobel de Economia de 1974, homem de notório saber nesse assunto, como exigem as leis para preenchimento de certos cargos públicos. Entre parênteses, o curioso nessa história é que Friedrich Hayek dividiu o "Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel" (denominação correta da láurea) com um opositor das suas ideias: Gunnar Myrdal, economista sueco, de tendência socialista, estudioso dos processos de desenvolvimento.
Mas, voltando ao principal, o fato é que a conjuntura econômica brasileira atual parece um retrato das teorias mais ortodoxas: excesso de dinheiro ou liquidez, gerada por cornucópias que o ex-presidente Lula abriu sem constrangimento e de maneira poucas vezes antes vista na história deste país - reajustes generosos do salário mínimo e dos salários do funcionalismo, expansão do Bolsa-Família, crédito farto para casa própria e outros fins, redução paulatina das taxas de juros.
Não há dúvida que isso confirmou parte do que dizia a música de Caetano Veloso: "A força da grana que ergue coisas belas..." A imprensa e as estatísticas brasileiras estão mostrando muito das coisas belas erguidas pela força da grana do governo, em termos de melhoria de vida do povo, de ascensão das classes mais pobres a níveis mais elevados de renda, de elevação do padrão de consumo e dos meios de sobrevivência, de tudo aquilo, enfim, que nos últimos três ou quatro anos colocou a figura de Lula no altar da adoração popular e... elegeu Dilma!
Mas a letra de Sampa ainda falava que a força da grana também destrói coisas belas.
Então, a ameaça que paira sobre o governo Dilma neste começo é o que muitos economistas previram e advertiram, e sobre o que a própria presidente deve ter meditado: a possibilidade não tão remota de destruição das coisas belas pela inflação - a coisa mais feia que o povo pobre deve temer no terreno da economia.
Os sinais são inequívocos: o desemprego chegou ao seu nível mais baixo desde 2003: 5,3% em dezembro passado. A renda real média do trabalhador subiu 3,8% em 2010. Coisas belas. A inflação também subiu: 5,91% em 2010, contra 4,31% em 2009. Coisa feia. A fórmula está se completando: mais emprego, mais renda, mais inflação.
E a inflação, no corpo econômico, é mais ou menos como a febre no corpo humano. E como a febre, também não é uma doença em si, é um sinal de que algo está errado no organismo. A febre surge para dizer ao seu portador que tome cuidado e, ao mesmo tempo, para ajudar o organismo a procurar um reequilíbrio. A inflação também surge, ou aumenta, para mostrar que a administração da economia não está no rumo certo e para corrigir os fatores que a tenham provocado. Por exemplo: se há excesso de dinheiro e ganhos de renda sem melhoria da produtividade, o aumento dos preços diminui o ganho de renda e consome o excesso de dinheiro. É um fator de correção, portanto. Só que, se deixada por sua própria conta, a inflação se autoalimenta, ganha impulso automático e deságua na hiperinflação, como já aconteceu no Brasil.
O Banco Central (BC) sabe disso, tanto que já vem adotando medidas para corrigir o curso dos acontecimentos antes que a inflação ganhe vida própria. Aumentou a taxa básica de juros, a Selic, aumentou os depósitos compulsórios dos bancos restringindo a disponibilidade de crédito, exigiu mais capital das instituições para financiamentos que ultrapassem 24 meses, enfim, está procurando andar na frente da inflação, corrigindo os fatores que a provocaram antes que ela mesma o faça de maneira desastrosa e socialmente cruel.
Mas não é fácil. Até porque o BC está meio sozinho nessa tarefa. O resto do governo não parece muito preocupado com o recrudescimento do IPCA e de outros indicadores de inflação. E os seus supostos aliados não dão muito apoio para que ele se decida a corrigir as demasias do período Lula.
Haja vista as reuniões que a equipe de Dilma vem mantendo com as lideranças sindicais sobre a questão do reajuste do salário mínimo. O pleito dos sindicalistas - de um salário mínimo de R$ 580 - é visivelmente desastroso para a estratégia de controle da inflação posta em prática desde dezembro pelo BC e, também, para as contas públicas dos três níveis de governo, particularmente para a Previdência. Mas eles insistem, porque acham que Dilma não pode tirar um naco daquilo que Lula deu. Mas isso é só ela que tem de resolver...
Um economista bem ortodoxo, clássico mesmo, diria "E daí? Uma coisa não leva à outra..?".
E do alto da sua sabedoria explicaria que menor desemprego significa mais emprego, que significa mais salários, que significa maior capacidade de consumo, que significa maior pressão sobre a demanda, sobre os preços e, finalmente, mais inflação.
E inflação, como ensinava um velho economista, também muito ortodoxo, não é exatamente elevação dos preços. A palavra inflação designa excesso de dinheiro, de moeda em circulação. Os preços elevam-se porque há excesso de dinheiro, pontificava o professor Hayek, Prêmio Nobel de Economia de 1974, homem de notório saber nesse assunto, como exigem as leis para preenchimento de certos cargos públicos. Entre parênteses, o curioso nessa história é que Friedrich Hayek dividiu o "Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel" (denominação correta da láurea) com um opositor das suas ideias: Gunnar Myrdal, economista sueco, de tendência socialista, estudioso dos processos de desenvolvimento.
Mas, voltando ao principal, o fato é que a conjuntura econômica brasileira atual parece um retrato das teorias mais ortodoxas: excesso de dinheiro ou liquidez, gerada por cornucópias que o ex-presidente Lula abriu sem constrangimento e de maneira poucas vezes antes vista na história deste país - reajustes generosos do salário mínimo e dos salários do funcionalismo, expansão do Bolsa-Família, crédito farto para casa própria e outros fins, redução paulatina das taxas de juros.
Não há dúvida que isso confirmou parte do que dizia a música de Caetano Veloso: "A força da grana que ergue coisas belas..." A imprensa e as estatísticas brasileiras estão mostrando muito das coisas belas erguidas pela força da grana do governo, em termos de melhoria de vida do povo, de ascensão das classes mais pobres a níveis mais elevados de renda, de elevação do padrão de consumo e dos meios de sobrevivência, de tudo aquilo, enfim, que nos últimos três ou quatro anos colocou a figura de Lula no altar da adoração popular e... elegeu Dilma!
Mas a letra de Sampa ainda falava que a força da grana também destrói coisas belas.
Então, a ameaça que paira sobre o governo Dilma neste começo é o que muitos economistas previram e advertiram, e sobre o que a própria presidente deve ter meditado: a possibilidade não tão remota de destruição das coisas belas pela inflação - a coisa mais feia que o povo pobre deve temer no terreno da economia.
Os sinais são inequívocos: o desemprego chegou ao seu nível mais baixo desde 2003: 5,3% em dezembro passado. A renda real média do trabalhador subiu 3,8% em 2010. Coisas belas. A inflação também subiu: 5,91% em 2010, contra 4,31% em 2009. Coisa feia. A fórmula está se completando: mais emprego, mais renda, mais inflação.
E a inflação, no corpo econômico, é mais ou menos como a febre no corpo humano. E como a febre, também não é uma doença em si, é um sinal de que algo está errado no organismo. A febre surge para dizer ao seu portador que tome cuidado e, ao mesmo tempo, para ajudar o organismo a procurar um reequilíbrio. A inflação também surge, ou aumenta, para mostrar que a administração da economia não está no rumo certo e para corrigir os fatores que a tenham provocado. Por exemplo: se há excesso de dinheiro e ganhos de renda sem melhoria da produtividade, o aumento dos preços diminui o ganho de renda e consome o excesso de dinheiro. É um fator de correção, portanto. Só que, se deixada por sua própria conta, a inflação se autoalimenta, ganha impulso automático e deságua na hiperinflação, como já aconteceu no Brasil.
O Banco Central (BC) sabe disso, tanto que já vem adotando medidas para corrigir o curso dos acontecimentos antes que a inflação ganhe vida própria. Aumentou a taxa básica de juros, a Selic, aumentou os depósitos compulsórios dos bancos restringindo a disponibilidade de crédito, exigiu mais capital das instituições para financiamentos que ultrapassem 24 meses, enfim, está procurando andar na frente da inflação, corrigindo os fatores que a provocaram antes que ela mesma o faça de maneira desastrosa e socialmente cruel.
Mas não é fácil. Até porque o BC está meio sozinho nessa tarefa. O resto do governo não parece muito preocupado com o recrudescimento do IPCA e de outros indicadores de inflação. E os seus supostos aliados não dão muito apoio para que ele se decida a corrigir as demasias do período Lula.
Haja vista as reuniões que a equipe de Dilma vem mantendo com as lideranças sindicais sobre a questão do reajuste do salário mínimo. O pleito dos sindicalistas - de um salário mínimo de R$ 580 - é visivelmente desastroso para a estratégia de controle da inflação posta em prática desde dezembro pelo BC e, também, para as contas públicas dos três níveis de governo, particularmente para a Previdência. Mas eles insistem, porque acham que Dilma não pode tirar um naco daquilo que Lula deu. Mas isso é só ela que tem de resolver...
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