sexta-feira, janeiro 07, 2011

KENNETH ROGOFF

Armagedon pode esperar
Kenneth Rogoff 

O Estado de S.Paulo - 07/01/11
Para onde se dirigem as moedas globais em 2011? Depois de três anos de enormes oscilações cambiais provocadas pela crise, é útil fazer uma avaliação dos valores das moedas e do sistema cambial como um todo. Estou convicto de que veremos uma mistura de guerras monetárias e colapsos, mas não vão significar o fim da recuperação econômica, muito menos o fim do mundo.


Para começar, temos de reconhecer que o moderno sistema de taxas de câmbio flutuante tem, no geral, se comportado surpreendentemente bem.

Na verdade, diante dos complexos fatores de risco e preferências políticas peculiares, tem sido um desafio adivinhar a lógica subjacente a essas grandes oscilações cambiais. Mas, mesmo que as taxas de câmbio funcionem de maneiras misteriosas, seu efeito protetor é inegável. A drástica desvalorização do euro após a crise ajudou a sustentar as exportações alemãs e, com isso, manter a zona do euro à tona.

As moedas dos mercados emergentes também sofreram quedas, mesmo em economias com imensas reservas em moeda estrangeira e relativamente pouco endividadas. Desde então, muitas moedas desses mercados tiveram uma forte recuperação. Numa retrospectiva, essas oscilações cambiais espelharam o colapso inicial e a subsequente recuperação do comércio global, ajudando a atenuar a recessão.

Inversamente, a crise financeira dificilmente foi um aviso para se expandir o escopo das taxas de câmbio fixas. Os países da periferia da zona do euro, incluindo Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha, presos ao mastro da moeda comum, não foram capazes de ganhar competitividade por meio de uma desvalorização da taxa cambial.

O pai intelectual do euro, Robert Mundell, da Universidade Columbia, disse certa vez que o número ideal de moedas no mundo é um número ímpar, preferivelmente menor que três.

Difícil ver a razão disso neste momento.

Talvez se tivermos um dia um governo mundial, ter uma moeda mundial terá sentido. Mas, mesmo deixando de lado os benefícios, em termos de equilíbrio, das moedas flexíveis, a perspectiva de um único banco central, onipotente, não é atraente. Prova disso foi a virulência e a histeria que acompanharam a política adotada pelo Federal Reserve do chamado "afrouxamento quantitativo". Imagine o pânico que se seguiria num mundo onde o ouro, commodities e arte fossem as únicas saídas para os investidores fugirem do dólar.

Mas o sucesso contínuo do sistema de taxas cambiais flutuantes não implica um curso tranquilo em 2011. Para começar, podemos esperar uma continuação das chamadas guerras monetárias, em que os países lutam para impedir uma valorização das suas taxas de câmbio e uma queda das suas exportações. Em 2011, os governos na Ásia provavelmente perderão "gradativamente" sua batalha nesta guerra, permitindo uma valorização das suas moedas, diante das pressões inflacionárias e ameaças de retaliações comerciais.

Quanto ao colapso monetário, o mais importante candidato é o euro. Num mundo ideal, a Europa resolveria o problema das dívidas excessivas através de uma reestruturação do passivo contabilizado pela Grécia, Irlanda e Portugal.

No momento, contudo, os estrategistas políticos europeus parecem preferir que o volume dos empréstimos-ponte para a periferia continue crescendo, não reconhecendo que os mercados acabarão por exigir uma solução mais durável e sustentável.

O dólar, por outro lado, parece ser uma aposta mais segura em 2011. Em primeiro lugar, seu poder de compra já chegou a um patamar muito baixo globalmente. Assim, um reequilíbrio normal da "paridade do poder de compra" deverá dar ao dólar um leve impulso de alta.

No caso do yuan da China, ele continua sustentado por um regime cambial altamente político. No final, o crescimento rápido da China terá que se refletir numa valorização significativa da sua moeda, no nível de preços domésticos, ou em ambos. Mas, em 2011, grande parte da busca do equilíbrio provavelmente ocorrerá por meio da inflação.

Finalmente, o caos monetário é a aposta mais segura de todas em 2011 e muito além, com oscilações imprevisíveis e drásticas das taxas de câmbio flutuante em todo o mundo. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

É PROFESSOR DE ECONOMIA E POLÍTICAS PÚBLICAS NA UNIVERSIDADE HARVARD

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