segunda-feira, outubro 25, 2010

FERNANDO RODRIGUES

Poligamias partidárias
FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SÃO PAULO - 25/10/10




BRASÍLIA - Existe uma indignação sazonal na política brasileira. A cada quatro anos, o país se choca ao se dar conta que só uma minoria dos deputados federais se elege com os próprios votos. Neste ano, foram apenas 35 dos 513.
É um erro atribuir o baixo nível do Congresso a esse fenômeno. O sistema eleitoral proporcional é até vantajoso: todos os votos contam.
Mesmo que o escolhido pelo eleitor não se eleja deputado, o voto vai para o partido. Quantos mais votos os candidatos de uma legenda têm, mais deputados a sigla elege.
A distorção se dá por causa das coligações partidárias. No Maranhão, o PT (de centro-esquerda) e o DEM (de direita) aliaram-se na eleição para a Câmara. Votar no PT ajudava o DEM e vice-versa.
A biodiversidade política é geral. No Amazonas, o DEM coligou-se ao PC do B. O PTB apoiou José Serra (PSDB) para presidente, mas na eleição de deputados no Acre uniu-se ao PT, de Dilma Rousseff.
Esse é um dos venenos da democracia representativa nacional. Um pacto de conveniência entre os partidos impede alterações.
Siglas menores dependem das grandes na hora de tentar eleger deputados. Já os partidos maiores precisam do apoio dos nanicos como meio de viabilizar seus candidatos a prefeito, governador ou presidente -por causa do tempo de propaganda no rádio e na TV.
Há alguns dias, o Datafolha apurou que 30% dos eleitores já não se recordavam em quem haviam votado para deputado. O percentual iria a quase 100% se a pergunta fosse sobre quais siglas estavam na coligação do candidato a deputado.
Uma medida profilática seria proibir coligações partidárias em eleições de deputados. O tema inexiste na campanha. Dilma promete erradicar a miséria. Serra, um salário mínimo de R$ 600. Ambos professam a crença em Deus. Mas eliminar as convenientes poligamias interpartidárias nenhum dos dois jamais ousou sugerir.

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