Mostrando a cara
O GLOBO - 06/02/10
Com os dados da inflação de janeiro na mão, o Banco Central provavelmente teria elevado ainda mais o tom sobre os riscos da volta do dragão. Os índices de janeiro divulgados ontem pelo IBGE e FGV ficaram acima das expectativas do mercado. E não foram apenas fatores sazonais ou pontuais que puxaram as taxas. A euforia da retomada do crescimento começa a influenciar os preços
O aumento da inflação no mês passado foi puxado principalmente por três grupos: transportes, alimentação e despesas pessoais.
A alta dos transportes já era esperada. Decorre dos reajustes nas tarifas de ônibus urbanos municipais e intermunicipais; 17,4% em São Paulo. E do aumento dos combustíveis: a disparada dos preços do álcool, que subiram 11% em um só mês, puxou para cima o preço da gasolina.
A alta do açúcar no mercado internacional reduziu a oferta desse produto e do álcool no mercado interno, pressionando os preços para cima.
A economista Irene Machado, do IBGE, destaca o aumento dos alimentos no resultado da inflação de janeiro.
Em dezembro, o grupo alimentos e bebidas tivera alta de 0,24%, enquanto no mês passado subiu 1,13%.
— As chuvas fortes que atingiram o país ao longo do mês de janeiro prejudicaram a colheita de muitas plantações, principalmente no Sul — explica.
A redução de investimentos na pecuária afetou a produção de carne. E o setor estaria com dificuldades para atender a demanda interna e externa. O preço do produto subiu 1,67% em janeiro.
As despesas pessoais saltaram de 0,46% em dezembro para 0,78% em janeiro. Nesse grupo, estão incluídos gastos com recreação, empregados domésticos — decorrente do reajuste do salário mínimo — e outros serviços como cabeleireiro e manicure.
É no aumento dos serviços que os analistas identificaram os sinais de que a euforia com a expectativa de retomada forte do crescimento já começa a estimular um movimento de elevação das margens de lucro para recuperar perdas do ano passado.
— Como a renda foi pouco afetada pela crise, a demanda por serviços também pode estar aumentando nesse contexto de expectativa de crescimento forte para 2010 — explica Irene.
O economista Elson Telles, da Concórdia, também foi surpreendido pelos resultados da inflação de janeiro. Ele esperava um IPCA de 0,70%, já acima da aposta do mercado (0,63%) e veio 0,75%. E o IGP-DI ficou ainda mais distante de sua projeção. O índice fechou em 1%, contra 0,75% esperado. Especialista em inflação, Telles confirma: — Ainda é cedo para fazer afirmações categóricas, mas tem algo mais influenciando as taxas que meramente fatores pontuais ou sazonais.
Sua análise também indica que os aumentos nos preços dos serviços decorrem de um movimento para de recuperação das margens de lucro.
— Esses preços estão muito atrelados ao aquecimento da economia e em janeiro os aumentos vieram muito fortes — destaca
Aço de sobra
O aço não será motivo de pressão inflacionária. Este foi o recado passado pelas lideranças do setor siderúrgico na conversa com o presidente Lula, quinta-feira. De acordo com o vice-presidente do Instituto Aço Brasil (IABr), Marco Polo de Mello Lopes, em 2010, a demanda interna vai consumir pouco mais de 50% da capacidade de produção, estimada em 48,5 milhões de toneladas: — Fizemos um balanço de 2009 e mostramos que este ano ainda teremos uma sobra de aço de cerca de 25 milhões de toneladas. Mesmo que a economia cresça fortemente, não haverá pressão de demanda sobre os preços.
A capacidade de produção deve subir para 77 milhões de toneladas em 2016, estima Marco Polo. Na reunião com o presidente, o pessoal do IABr também garantiu que não faltará aço nacional para a execução dos investimentos da Copa do Mundo, présal e Olimpíadas, que devem consumir 8 milhões de toneladas do produto.
Nem o básico
Dados da Abcon mostram que mais da metade dos estados brasileiros tratam menos de 20% do esgoto despejado. Somente o Distrito Federal consegue índice superior a 80%, enquanto em São Paulo o percentual cai para pouco mais de 40%. No caso da coleta, os números também são ruins: 11 estados coletam menos de 20% do esgoto. DF e SP conseguem índices de 80%, enquanto Minas, entre 60% e 80%. Para o presidente da Abcon, Yves Besse, que apresentou os dados em reunião na CNI esta semana, a qualidade do saneamento está ligada à gestão e não ao nível de renda da população. A prova seria a situação de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que estão entre os 15 estados que tratam menos de 20% do esgoto.
COM ALVARO GRIBEL
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