Assombrações rondam os mercados
FOLHA DE SÃO PAULO - 29/01/2010
Os mercados financeiros do mundo viveram dias de grande volatilidade em janeiro. Nas duas primeiras semanas o otimismo generalizado foi a sensação dominante entre os investidores; depois, o quase pânico voltou a rondar as Bolsas de Valores e os mercados de câmbio em todo o mundo.
Para o analista que acompanhou esse vaivém fica a impressão clara de que mudanças fortes precisam ser feitas na regulação do sistema financeiro mundial. Não é possível que a vida de bilhões de pessoas fique na dependência dos humores e exageros de alguns milhares de profissionais das finanças.
Os custos sociais gerados pela crise financeira que vivemos, e que serão cobrados ao longo dos próximos anos em várias sociedades, serão muito maiores do que os estimados anteriormente. O crescimento econômico, principalmente nos países do mundo desenvolvido, estará comprometido por muito tempo em função do esforço fiscal que precisará ser realizado para reequilibrar as finanças dos governos.
A história nos mostra que não havia outra alternativa, além da utilização de trilhões de dólares dos governos, para salvar um grande número de instituições financeiras da falência. Os custos da depressão, que certamente se seguiriam ao colapso do sistema bancário, seriam muito maiores. Mas essa conta será cobrada nos próximos anos. Por isso a fixação de regras mais duras para mudar a forma como operam os bancos para evitar a repetição do que aconteceu é agora imperativa.
Mas não será fácil essa tarefa. Principalmente por duas razões: de um lado, as novas regras precisarão ter uma abrangência mundial; do outro, porque o risco do populismo dominar as decisões é muito forte e compreensível. Afinal, os eleitores -que são os que pagarão a conta- estão revoltados e querem sangue.
As dificuldades técnicas, associadas a uma regulação que nos proteja contra novas crises e, ao mesmo tempo, permita que as instituições bancárias funcionem de forma eficiente, são imensas. Se adicionarmos a essas dificuldades um clima de caça às bruxas não vamos chegar a lugar nenhum.
O Brasil é hoje um paraíso quando se trata de regulação financeira. Aprendemos com as crises do passado -a última durante o mandato de presidente Fernando Henrique Cardoso- e não caímos no conto do vigário das ideias desenvolvidas principalmente nos Estados Unidos e na Inglaterra. Hoje a sociedade em função da blindagem racional e eficiente das nossas instituições bancárias.
Uma das causas dessa estabilidade é a existência de uma burocracia eficiente nos principais órgãos reguladores no Brasil. A cultura de instituições como o Banco Central e a CVM nos protegeu de alucinações liberais em vários momentos de nossa história recente. Por isso estamos hoje fazendo apenas pequenas alterações nas regras existentes. Um exemplo disso é a mudança na legislação relativa aos chamados derivativos de crédito e câmbio, implementada recentemente pelo Conselho Monetário Nacional.
Enquanto a grande maioria dos países está metida em uma verdadeira camisa de onze varas, nós brasileiros podemos nos dar ao luxo de passar um pente fino em nossa legislação e fazer pequenos ajustes -como esse- para melhorá-la. Isso vai fazer uma enorme diferença nos próximos anos.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 67, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
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