A China turbina o consumo
O ESTADO DE SÃO PAULO - 13/12/09
Aqui tem um "pibinho", lá tem um "pibão". A China não está apenas informando que vai crescer mais de 8% neste ano de crise. Está revelando uma importante mudança na direção de sua economia, agora também voltada para o mercado interno.
Os números apresentados sexta-feira pelo National Bureau of Statistics of China (agência oficial) mostram que o produto industrializado cresceu 19,2% em novembro (em relação ao mesmo mês do ano passado) e que as vendas no varejo tiveram um salto de 15,8% também em novembro, mais do que o dobro do que ocorre hoje na economia global.
Há mais um punhado de surpreendentes novidades. Pela primeira vez na história, ao longo deste ano os chineses comprarão mais automóveis (cerca de 12,8 milhões) do que os americanos (que ficarão com 10,3 milhões), como registra o New York Times. Nos computadores de mesa (desktops), eles também estão à frente: no terceiro trimestre do ano, compraram 7,2 milhões de unidades, enquanto os americanos não passaram dos 6,6 milhões. E praticamente não há item de consumo com desempenho divergente desses, de aparelhos domésticos a roupas e sapatos; de móveis a instrumentos musicais; de joias a obras de arte.
A eclosão da crise global parece ter sido o pretexto para que o governo chinês mudasse a orientação de sua política econômica. Até recentemente, seu sistema produtivo estava essencialmente voltado ao atendimento das exportações. Diante da perspectiva de encolhimento do mercado mundial em consequência da recessão, o governo estimulou o consumo interno por meio do aumento das despesas públicas (políticas anticíclicas) e da expansão do crédito bancário.
Nada menos que 25% dos veículos vendidos neste ano (cerca de 40% a mais do que no ano passado), a uma média de US$ 17 mil cada um, foram financiados pelo sistema bancário chinês. Neste ano (dados até setembro), o movimento dos cartões de crédito havia se expandido perto dos 50%.
É cedo para concluir que a guinada em direção ao mercado interno seja definitiva. O que se pode dizer é que não tem sustentação a longo prazo o arranjo prevalecente até aqui, em que os Estados Unidos entraram como país consumidor e importador de mercadorias e de poupança; e a China como supridora de manufaturados baratos e financiadora do consumo americano (por meio da compra de títulos do Tesouro dos Estados Unidos). Entre as explicações para isso está a de que nem a China terá condições de empilhar reservas indefinidamente nem os Estados Unidos de se endividarem como estão se endividando.
O impressionante aumento da produção e do consumo na China (deverá voltar a crescer ao redor de 12% ao ano em 2010 e 2011) é boa notícia para o Brasil, grande fornecedor global de commodities. Mas traz de volta à mesa de discussões uma questão inquietante. O consumo chinês segue de perto o modelo americano. A indústria que está vendendo ao mercado interno é basicamente a mesma que foi montada para atender ao mercado dos Estados Unidos e do mundo rico. E, já no início desta década, o biólogo americano Edward Osborne Wilson advertia: "Precisaríamos de mais quatro planetas Terra para sustentar toda a população do mundo nos padrões de consumo dos Estados Unidos."
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