Revista IstoÉ
O mercado financeiro tolerava Bolsonaro, era considerado boquirroto, tosco, ignorante
A escalada bolsonorista contra o Estado Democrático de Direito continua de vento em popa. Desde 1º de janeiro de 2019, Jair Bolsonaro age frontalmente contra as instituições. É o cavaleiro das trevas do reacionarismo. O autoritarismo explícito, a falta de decoro, o uso de instituições de Estado como instrumentos da sua vontade, tudo era relevado. Afinal, o importante seria o programa econômico e as reformas estruturantes repetidas ad nauseam pelos porta-vozes do mercado.
Era o que interessava. Seria o preço a ser pago pela reestruturação do processo de acumulação capitalista. Já que os partidos tradicionais tinham dificuldade de empolgar o eleitorado, desgostoso com os escândalos sucessivos de corrupção, restou ao grande capital apoiar um desconhecido, meio exótico para os padrões da Faria Lima, mas que parecia amestrado no campo econômico. O mercado não via em Bolsonaro alguém com um projeto próprio de poder. Era encarado como um boquirroto, tosco, ignorante.
Mas a chegada do coronavirus mudou este quadro. Mesmo sem oposição de fato, e graças à ação desastrada e desumana, Bolsonaro acabou se transformando mundialmente no símbolo maior da incompetência no enfrentamento do covid-19, inclusive colocando em risco as bases da economia brasileira e, por sua vez, prejudicando o mercado. Não há especulador que resista a uma recessão de -7%/-8% e a possibilidade de um lustro de crescimento medíocre derrubando a renda per capita e o índice de desenvolvimento humano. Isto porque a somatória da piora sucessiva da distribuição de renda com o aumento da miséria pode se transformar, em curto prazo, em combustão para uma explosão social em escala nunca vista no Brasil.
A fuga de capitais é uma demonstração inequívoca que o grande capital internacional já abandonou qualquer manifestação de apoio, mesmo discreto, ao governo. Internamente, as frações mais modernas do capitalismo nacional detectaram que o futuro econômico do país — e de seus negócios — está seriamente comprometido. Constatou que não há mais uma política econômica, uma ação coordenada pelo ministério da Economia e suas secretarias. Viu que em meio a pandemia o que sobrou foi um governo lutando para se manter a todo custo no poder. E que sonha com o rompimento da institucionalidade, isolando ainda mais o país da comunidade internacional. Começou a contagem regressiva para o fim do governo Bolsonaro. Mas sem ação política, a agonia pode ser longa.
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