Com fracasso no coronavírus, presidente revive segurança e cartilha ideológica
Jair Bolsonaro deve ter se cansado de cometer erros na crise do coronavírus. Depois de prever só 800 mortes no país, de insistir no poder milagroso de um remédio e de atazanar governantes que tomaram medidas de isolamento, o presidente decidiu fingir que não tem mais nada a ver com isso.
A curva de mortes está em disparada, mas Bolsonaro afirma que o problema é de governadores e prefeitos. Já o ministro da Saúde admitiu que está "navegando às cegas" e que ninguém sabe quando vai ser o pico da contaminação, embora seu chefe tenha dito há pouco mais de duas semanas que estava "começando a ir embora a questão da pandemia".
Bolsonaro comprovou sua incompetência para lidar com a crise e, agora, resolveu abrir um baú de brinquedos antigos para distrair suas bases.
Como se não existisse uma doença devastadora, ele voltou a acenar a redutos conservadores com uma pauta voltada à segurança pública e sua conhecida cartilha ideológica.
Na semana passada, depois de acertar a demissão do diretor da Polícia Federal, Bolsonaro pegou carona numa manifestação de grupos evangélicos e publicou um vídeo em que crianças diziam ser contra o aborto. O tuíte teve mais de 85 mil interações entre seus seguidores.
O presidente ainda tentou reviver a ameaça fantasma da esquerda na educação. Em dois eventos sem relação com a área, Bolsonaro elogiou o ministro Abraham Weintraub e reclamou da "doutrinação de décadas" nas escolas brasileiras.
A ideia é mudar de assunto e reforçar seu vínculo com grupos que poderiam ficar perturbados com a escalada de mortes ou a saída de Sergio Moro do governo. Para isso, vale buscar também seu adormecido discurso linha-dura na segurança.
Nesta quarta (29), o novo ministro da Justiça exagerou na propaganda e disse que o presidente é "um profeta no combate à criminalidade". O deputado Bolsonaro jamais aprovou um projeto de lei sobre o tema. No Planalto, não desenvolveu nenhuma política pública relevante na área.
Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).
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