O GLOBO - 05/08
A Previdência precisa se atualizar diante das transformações demográficas, sociais e econômicas
O Brasil é um ponto fora da curva em relação às pensões por morte. A despesa pública com esse benefício gira em torno de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). A média no âmbito dos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 1% do PIB.
Entre as nações que integram a OCDE, 12 gastam menos que 0,5% do PIB com pensões; entre elas, Suécia, Noruega e Reino Unido. Trata-se de uma comparação com países que possuem sistemas de proteção social que estão entre os melhores do mundo.
A Previdência precisa se atualizar diante das transformações demográficas, sociais e econômicas que ocorrem ao longo do tempo. Muitos países têm se adaptado a essa nova realidade, redirecionando recursos para ações que combatam a pobreza e a desigualdade.
No Brasil, a maioria dos beneficiários de pensão por morte é formada por mulheres, pois vivem mais do que os homens. Entretanto, uma mudança cultural tem chegado ao sistema de proteção social: cada vez mais as mulheres conseguem a própria aposentadoria, diminuindo a dependência em relação à pensão.
De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, entre 1992 e 2015 o percentual de pensionistas que acumulavam esse benefício com aposentadoria aumentou de cerca de 10% para um terço do total. E a tendência de alta deve ser mantida, pois são inúmeras as pensionistas que ainda não atingiram a idade e/ou o tempo de contribuição necessários para aposentadoria.
De fato, no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), as mulheres já são maioria não apenas de pensionistas, mas também de aposentadas. Dos 20,9 milhões de aposentados ativos em maio de 2019, 10,5 milhões eram mulheres (50,2%). Se forem considerados apenas os aposentados por tempo de contribuição, idade e invalidez, a participação das mulheres chega a 51,1% do total.
Conforme a Pnad, a cobertura dos trabalhadores já era maior entre as mulheres do que entre os homens. Nesse novo contexto, o valor das pensões por morte deve considerar se os cônjuges têm filhos menores e se possuem outras fontes de renda, até como forma de evitar diferenças de tratamentos não justificáveis e de alocar os recursos escassos da melhor forma. Pelo texto aprovado na Câmara em primeiro turno, em nenhuma hipótese o segurado receberá menos que o salário mínimo no total de suas rendas formais.
Um argumento largamente utilizado contra as mudanças na pensão é que a perda de um membro da família não leva necessariamente à redução dos gastos pela existência de custos fixos. Contudo, também de acordo com dados da Pnad, 83,6% das mulheres aposentadas e pensionistas viviam em imóvel próprio já pago ou quitado. Quando se consideram as mulheres idosas, esse percentual se elevava para 84,8% do total.
A necessidade de ajustar as regras de pensão por morte no Brasil às melhores práticas internacionais foi reconhecida até mesmo por governos da esquerda, com o envio da Medida Provisória nº 664 em 2014, posteriormente convertida, com alterações que retiraram algumas medidas inicialmente propostas, na Lei nº 13.135/2015. Portanto, permanece plenamente válida a constatação de que é preciso reformular as regras desse benefício, de forma a redimensionar o seu impacto sobre as políticas da Previdência Social, considerando o desafio de se manter um sistema sustentável financeiramente e alinhado com questões demográficas.
As mudanças aprovadas até o presente momento nas regras de pensão por morte se enquadram na construção de uma Nova Previdência não apenas sustentável a médio e longo prazo, como também, na racionalização do uso dos recursos para aqueles que mais precisam, o que torna o sistema mais justo do ponto de vista social.
Rogério Marinho é secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia
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