O GLOBO - 24/04
Ontem foi o dia das duas batalhas. A que atraiu mais atenção foi travada no STJ, que discutiu o recurso do ex-presidente Lula. A redução da pena era previsível, costuma ocorrer em instâncias superiores, mas há dois fatos relevantes no julgamento. Primeiro, com o voto unânime, manteve-se a condenação de Curitiba e Porto Alegre. Segundo, supera-se, no caso do Lula, a discussão sobre o cumprimento da pena após a condenação em segunda instância. A outra batalha mostrou que o governo está tendo muito mais dificuldade do que esperava na tramitação da reforma da Previdência e isso basicamente pelos erros que tem cometido.
O que esse tempo em que Lula ficou — e ainda ficará — preso mostrou ao Brasil é que a esquerda não conseguiu ter novas lideranças. A sombra de Lula prevaleceu. O PT não tem conseguido liderar a oposição. Os maiores constrangimentos ao governo Bolsonaro foram criados por sua própria incapacidade de articular uma base parlamentar e pelas ferozes brigas internas.
O juiz que condenou Lula no dia 12 de julho de 2017, Sérgio Moro, é hoje um ministro do governo que se elegeu usando o discurso do combate à corrupção. Não se pode por isso fazer uma relação causal pretérita. Moro não o condenou com o propósito de ir para o governo Bolsonaro, que nem fora eleito ainda. Mas a sua decisão de ir para o Ministério, perseguindo o sonho lotérico do Supremo Tribunal Federal, jogou uma sombra sobre suas antigas decisões, a mais dramática delas, a de condenar o ex-presidente Lula. O dia de ontem, contudo, foi de alívio para Moro. Afinal, o STJ confirmou a condenação, apenas reduzindo a pena. Para Lula, também houve o alívio de uma vitória, depois de tantas derrotas jurídicas. Sua defesa agora passa a discutir a progressão de regime que pode levá-lo ao semiaberto em setembro.
A vitória de Lula é parcial, mas não é menos significativa. Para quem está preso, saber o tempo que resta é um enorme alívio. Passa-se à contagem regressiva que é muito melhor do que o tempo indefinido dentro de uma cela. E pode até ser surpreendido por uma saída mais rápida. O problema é que ele já está condenado no processo do sítio de Atibaia. Ao todo, enfrenta sete ações penais. A vitória a ser comemorada ontem foi o “parcial provimento” que a 5ª Turma do STJ deu ao seu agravo regimental, na primeira das ações, a do triplex do Guarujá.
Enquanto o STJ concentrava a atenção da maioria do país, a CCJ iniciava mais uma desgastante discussão em torno da admissibilidade da reforma da Previdência. A tramitação ficou mais difícil pelos erros cometidos pelo governo. O sigilo dos dados que levaram às propostas foi para que não se antecipasse na CCJ a discussão de mérito. O problema é que, ao não dar os cálculos, o governo pareceu ter um segredo a esconder. E mais, isso foi usado pela oposição no pior embate contra o projeto. Numa dessas ironias da política, a líder da minoria, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), usou um dispositivo incluído na Constituição pela emenda 95, a do teto de gastos do governo Temer, para tentar suspender a tramitação da reforma. O ponto estabelece a suspensão, por 20 dias, de um projeto que crie despesas ou renúncia fiscal e que não tenha sido acompanhado de cálculos. O deputado Arthur Maia (DEM-BA) ponderou que o projeto não aumenta despesas, pelo contrário. Mas, afinal, não dá saber se não se tem os dados.
Todos os números correm a favor de quem quer provar que o Brasil precisa fazer uma reforma da Previdência, por razões fiscais e para reduzir as desigualdades do sistema. Seria bom se a esquerda fosse capaz de ver a eloquência dos dados que mostram as enormes vantagens para uma minoria dos beneficiários. Mas todas as reformas foram feitas no terreno conflagrado da luta política. Na que foi comandada pelo ex-presidente Lula, e que afetou o funcionalismo, houve inclusive racha no PT, levando-se à criação do PSOL. Ontem, PT e PSOL estavam juntos contra a proposta do governo de Bolsonaro, que, quando deputado, sempre votou contra todas as reformas. A pressão dos partidos do centrão permitiu que o projeto fosse melhorado, com a retirada de pontos que não tinham a ver com a reforma. Essa primeira batalha mostrou que o governo tem que se fortalecer para a Comissão Especial.
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