FOLHA DE SP/O GLOBO - 18/02
A ideia da intervenção do governo federal na Segurança do Rio veio tarde e é curta. O governador Luiz Fernando Pezão precisa ir embora. Não tem saúde, passado, nem futuro para permanecer no cargo num estado falido, capturado por uma organização criminosa cujos chefes estão na cadeia. Como? Ele desce do gabinete, entra no carro e vai para casa.
Na quinta-feira, quando esteve no Planalto, Pezão disse a Temer que a situação da Segurança Pública do Rio saíra do seu controle. Ao deputado Rodrigo Maia, mencionou a “calamidade” e acrescentou: “Não podemos adiar nem mais um dia.” Há duas semanas, o mesmo Pezão se orgulhava da qualidade e da eficiência de suas polícias, reclamando do que seria uma “cobertura cruel.”
Desorientado (há tempo), o governador construiu um caso clássico para demandar uma intervenção ampla, geral e irrestrita no Rio. Nada a ver com o que se armou no Planalto.
Sérgio Cabral (patrono de Pezão) e Jorge Picciani (“capo” do PMDB) não estão na cadeia pelo que fizeram na Segurança. Ambos comandaram a máquina corrupta que arruinou as finanças, o sistema de ensino e a saúde pública do estado. A corrupção e a inépcia policial são apenas o pior aspecto da ruína.
Colocar um general como interventor no aparelho de Segurança, sem mexer no dragão das roubalheiras administrativas, tem tudo para ser um exercício de enxugamento de gelo. Ou algo pior: o prosseguimento de uma rotina na qual as forças policiais invadem bairros pobres e proclamam vitória matando “suspeitos.”
A intervenção proposta por Temer coloca Pezão e seus amigos no mundo de seus sonhos. Num passe de mágica, o problema do Rio sai do Palácio Guanabara (onde mora há décadas) e vai para o colo de um general. Esse semi-interventor assumiria com poderes para combater o crime organizado. O Planalto deve burilar sua retórica, esclarecendo que não se considera crime organizado aquilo que o juiz Marcelo Bretas vem mostrando ao país.
Temer conhece a Constituição e sempre soube que podia decretar a intervenção federal no governo do estado. A Constituição impede que se promulguem emendas constitucionais havendo unidades sob intervenção, mas a reforma da Previdência poderia ser votada na Câmara (se fosse) para ser promulgada no dia da posse do governador, em janeiro de 2019.
Há um cheiro de marquetagem na iniciativa: a reforma seria congelada por causa da intervenção na Segurança do Rio. Patranha. Ela encalhou por falta de votos e a intervenção, podendo ser integral, será light. Temer, que presidiu o PMDB até ser substituído pelo notável Romero Jucá, estancou a sangria, ajudou os correligionários que destruíram o estado e jogou a batata quente no colo de um general.
A saída de Pezão permitiria o desmantelamento do esquema de poder do PMDB antes da eleição de outubro. Sérgio Cabral e Picciani, “capos” dessa máquina, estão trancados, mas ela está viva. Leonardo, filho de Picciani, é o ministro do Esporte de Temer, cujo governo tem dois ex-ministros na cadeia (Geddel Vieira Lima e Henrique Alves). Todos do PMDB, como o ex-governador Moreira Franco, conselheiro especial do presidente.
A intervenção federal permitiria que o Estado do Rio passasse por uma faxina. Até a posse do governador que será eleito em outubro, o interventor poderia desmantelar a teia de ladroagens que arruinou o estado. Quem seria esse interventor? Para que a conversa possa prosseguir, aqui vão dois nomes: Pedro Parente e Armínio Fraga. Os dois estão bem de vida e odiariam a ideia, mas nasceram no Rio e sabem que devem algo à terra. Parente administrou a crise de energia no governo de Fernando Henrique Cardoso e está ressuscitando a Petrobras. Deem-lhe uma caneta e alguns pares de algemas e ele ergue o Rio.
Esse seria um cenário de emergência para uma situação de calamidade. Pode parecer ideia de maluco, mas nem o maior dos doidos poderia imaginar que, em menos de cinco anos, o Rio chegasse onde chegou.
Ciro Gomes
Um pedaço do andar de cima namora a ideia de colocar Geraldo Alckmin no Planalto. Como? Não sabem. Outro pedaço preferia Luciano Huck. Para quê? Não sabiam. Todos estão de acordo num ponto: Lula não pode disputar.
Essas construções têm lógica, mas criam um vácuo no qual só um candidato amplia sua base eleitoral: Ciro Gomes, pronto para encarnar o contra-tudo-o-que-está-aí.
Os Gomes disputam o mando na cidade cearense de Sobral desde 1890. Seu pai foi prefeito, e dois de seus irmãos também. Ciro e Cid governaram o estado. Ele foi ministro de Itamar Franco e de Lula. O mano, de Dilma.
Fernando Henrique Cardoso traçou um breve perfil de Ciro em seus “Diários”:
“Ele é uma personalidade complicada; é precipitado, afirmativo, inteligente, tem coragem, mas é um pouco oportunista nas posições e não vai muito fundo nas questões.”
Faltou mencionar seu fraco pela autocombustão.
Paris 2.0
Cozinha-se a possível nomeação do senador e atual chanceler Aloysio Nunes Ferreira para a embaixada do Brasil em Paris.
Temer faria a mudança ao apagar das luzes de seu governo, retribuindo a lealdade que recebeu do tucano. Uma vez em Paris, quase certamente ele seria mantido pelo novo presidente.
O retorno de Nunes Ferreira a Paris contará uma grande história. Em 1968, ele chegou à França fugindo da polícia. Era o “Mateus”, eventual motorista de Carlos Marighella e participara de dois assaltos. Durante um breve período ele foi o embaixador da Ação Libertadora Nacional na França.
Na sua segunda embaixada, Nunes Ferreira não passará pelas ansiedades de “Mateus”.
Carnaval
É falsa a ideia de que o carnaval acabou.
Temer anunciou a criação do Ministério da Segurança Pública e criou uma ala de 12 ministros para uma comissão de frente emergencial.
O desfile das escolas de samba tratou da realidade, mas o Planalto manipula fantasias.
Praga da ciclovia
Em 2016, quando a ciclovia Tim Maia desabou, matando duas pessoas, o então prefeito do Rio, Eduardo Paes, estava na Grécia. Choveu, a Tim Maia desabou de novo, e o prefeito Marcelo Crivella estava sabe-se lá onde, na Europa, longe da chuva que matou quatro pessoas.
Seria melhor se os doutores se candidatassem a viver no circuito Elizabeth Arden e fossem mandados para as cidades de seu gosto, com tudo pago.
Medo de Crivella
Marcello Crivella derrotou Marcelo Freixo com 1,7 milhão de votos contra 1,2 milhão.
Os votos nulos foram 570 mil, e a abstenção chegou a 1,3 milhão (26,85%).
Muita gente votou em Crivella, anulou o voto ou não foi à urna porque tinha medo de Marcelo Freixo.
Ninguém tinha medo de Crivella. Má ideia.
Sem nexo
O empresário Joesley Batista disse à Polícia Federal que, na sua conversa noturna com Michel Temer, fez um sinal com os dedos indicando que colocaria dinheiro nas suas tratativas com Rodrigo Rocha Loures.
Joesley tinha um gravador escondido, recorrer a um gesto não faria o menor sentido. Seria o único caso em que o grampeador evita o próprio grampo.
Se Joesley tivesse dito isso antes, teria feito a festa do advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que conseguiu defender Temer na Câmara.
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