O governo interino do presidente Michel Temer tem emitido sinais dúbios. Há o diagnóstico de que é necessário realizar um ajuste fiscal estrutural. No entanto, o governo emite muitos sinais na direção contrária.
Foram aprovados ou estão próximo da aprovação pelo Congresso Nacional 14 projetos que aumentam salários de inúmeras carreiras do serviço público. Desnecessário dizer que, nas atuais circunstâncias de desemprego elevado e salário real em queda para o setor privado, é difícil justificar politicamente o tratamento privilegiado às corporações do serviço público, que gozam de estabilidade e de salários maiores aos pagos pelo setor privado.
Já o projeto de lei complementar que renegocia as dívidas dos governos estaduais com a União foi desfigurado pelo Congresso. A principal contrapartida estrutural era definir melhor o conceito de gasto com pessoal para efeitos da verificação do limite de 60% da receita corrente líquida. Essa definição era essencial para impedir uma série de formas de contornar a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) que foram criadas nos últimos anos.
Adicionalmente, a renegociação das dívidas dos governos estaduais não foca o problema das finanças públicas dos Estados, que estruturalmente gastam mais do que arrecadam. Durante muitos anos essa situação ficou escondida, pois a receita cresceu muito acima da economia.
Ou seja, diferentemente do que boa parcela da classe política pensa, o desequilíbrio das finanças dos Estados não cessará com a volta do crescimento econômico. O crescimento minorará o problema fiscal estadual, mas não inverterá o sinal da equação.
Aparentemente tucanos e democratas reconheceram o tamanho do problema e estão pressionando o governo Temer. Para todos os que conhecem o PMDB, é difícil se convencer da súbita conversão à responsabilidade fiscal.
O senador Ricardo Ferraço, do PSDB do Espírito Santo, apresentou relatório contrário ao projeto de lei que eleva os salários do STF, na terça-feira passada (23), na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos). Valdir Raupp, do PMDB de Rondônia, apresentou voto em separado favorável ao pleito do Supremo.
Já se fala que o projeto de emenda constitucional que estabelece o teto para o crescimento nominal do gasto primário da União ficará para ser aprovado em 2017. Certamente a aprovação da reforma da Previdência ficará para depois.
É possível que a lassidão fiscal verificada até o momento seja reflexo da falta de força que resulta da interinidade.
Outra interpretação é que os políticos –num momento em que a economia ensaia retomada tímida e as expectativas inflacionárias e a própria inflação são cadentes– têm muita dificuldade de enxergar claramente o problema fiscal e consideram que a elevação da receita que virá com a recuperação será suficiente para arrumar a casa. Nunca faltarão economistas para defender essa tese. E, certamente, os políticos preferirão seguir esses economistas com mensagens mais auspiciosas.
Assim, há risco real de termos que esperar alguma punição maior do mercado –como ocorreu com Joaquim Levy a partir de agosto do ano passado– ou o retorno da inflação para que a política pense de fato em arrumar a casa fiscal.
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