Nunca fui muito simpático à Lei da Ficha Limpa. Até acho que dá para defendê-la por razões táticas, mas, conceitualmente, eu a vejo como uma limitação do poder do voto do cidadão. Em princípio, eleitores deveriam ter a possibilidade de escolher alguém com problemas com a Justiça. Pense num Robin Hood, ou, num exemplo menos mitológico, num Lula em 2018. Não recomendaria reconduzir tão cedo o PT ao comando do governo federal, mas impedir o principal líder do partido de concorrer não soa lá muito democrático.
Seja como for, a Ficha Limpa veio para ficar. Isso dito, não gostei da decisão que o STF tomou nesta semana de determinar que apenas as Casas Legislativas têm poder para tornar inelegíveis políticos que tiveram suas contas reprovadas pelos tribunais de contas estaduais e municipais. O juízo parece contrariar a própria lógica da Ficha Limpa, que é a de submeter a filtros técnico-jurídicos os nomes que serão apresentados ao crivo do eleitor. Não há dúvida de que os tribunais de contas são órgãos mais técnicos do que câmaras e assembleias, que são instituições eminentemente políticas. E, se é para decidir politicamente e não tecnicamente, então faria mais sentido dar esse poder diretamente ao eleitor, revogando a Ficha Limpa.
Não sei se as pessoas que escreveram essa lei estavam bêbadas, como sustentou o ministro Gilmar Mendes, mas cometeram erros. Parece-me escandaloso que tenham equiparado a exclusão por órgão profissional a uma condenação judicial em segunda instância. Consigo imaginar algumas razões virtuosas que poderiam levar um advogado a ser expulso da OAB, por exemplo. Denunciar o corporativismo da Ordem é a mais óbvia.
O ponto central, me parece, é que a Ficha Limpa tem como pressuposto uma concepção equivocada, que é a de que é possível "corrigir" o eleitor fabricando leis e decretos que o impeçam de escolher "errado".
Nenhum comentário:
Postar um comentário