Prenuncia-se no Congresso uma tramitação tormentosa para o projeto que estabelece limites anuais para os gastos públicos. Uma amostra pequena, mas esclarecedora, dos percalços pela frente se viu na semana que passou, em sessão da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.
Durante audiência convocada para debate da proposta, os partidos aliados à presidente afastada, Dilma Rousseff (PT), manifestaram, como se previa, sua posição contrária. Causaram espécie, entretanto, as resistências explicitadas por senadores hoje alinhados ao Palácio do Planalto.
O médico ruralista Ronaldo Caiado (DEM-GO) preocupou-se com os reajustes dos valores pagos por procedimentos do SUS. Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), ex-ministro da Integração Nacional, defendeu a preservação das obras de infraestrutura. O paraense Flexa Ribeiro (PSDB) disse que seu Estado precisa de mais leitos hospitalares.
Exemplifica-se, à perfeição, o fenômeno descrito pelo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn: mesmo os que são favoráveis, em princípio, ao ajuste orçamentário tratam primeiro de seus interesses particulares ou setoriais.
Precedentes perigosos, diga-se, foram abertos pelo governo do ainda interino Michel Temer (PMDB), que cedeu sem maior regateio a pleitos das associações do funcionalismo público. Primeiro, ao patrocinar reajustes salariais para os servidores da União; depois, ao desistir de restrições ao gasto com pessoal nos Estados.
A abertura da temporada de concessões despertou lobbies tão diversos quanto o dos militares, que se empenham em escapar da reforma da Previdência, e o dos governadores das regiões Norte e Nordeste, em busca de mais repasses do Tesouro Nacional.
Iniciativas para a contenção de despesas, claro, são controversas por natureza. A proposta do teto —que proíbe alta do gasto total acima da inflação— colide, ademais, com péssimos costumes do Legislativo brasileiro. De imediato, deixariam de vigorar as regras que vinculam parcelas da receita a áreas como saúde e educação.
Com o novo mecanismo, transfere-se aos parlamentares a tarefa de arbitrar a cada ano a alocação de recursos limitados, o que implica definir prioridades e descontentar grupos influentes. Acabam subterfúgios como estimativas fantasiosas da arrecadação, que o Executivo corrige a toda hora.
O Congresso não aceitará facilmente tal responsabilidade, ainda que seja uma de suas funções essenciais. Bem mais cômodo é o escapismo orçamentário, em que a militância pelo particular acarreta o malefício de todos.
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