ESTADÃO - 31/08
Seria preciso ver, em primeiro lugar, com que base política a presidente Dilma seria chamada a governar
O cenário pode ser fortemente improvável, mas a pergunta tem lá sua importância: qual seria a política econômica dos dois próximos anos e pico se a presidente Dilma conseguisse o número mínimo de votos no Senado (28) e fosse reconduzida à Presidência da República?
Pelas críticas contundentes à política econômica do presidente em exercício Michel Temer, feitas segunda-feira no Senado, fica subentendido que, em caso de retorno, Dilma optaria, a seu estilo, por um modelão heterodoxo de condução da economia.
Não dá para descrever o que seria isso. Depois de tudo o que deu errado, não faria sentido imaginar que a presidente Dilma restabeleceria a Nova Matriz Macroeconômica, baseada no consumo artificial e no aumento da dívida pública. Mas, pelas declarações, ficou claro que do seu novo cardápio não constaria uma PEC que, por 20 anos, restringisse o aumento das despesas públicas à correção pela inflação passada, como a que tramita no Congresso. Seja o que for, em que estado ficariam as contas públicas?
Pelo ataque aos projetos de reforma da Previdência e das regras trabalhistas que vêm sendo estudados pelo governo de Michel Temer, também parece claro que um novo período Dilma postergaria quanto pudesse essas reformas.
Mas a questão mais importante extrapola a simples escolha das diretrizes macroeconômicas. Seria preciso ver, em primeiro lugar, com que base política a presidente Dilma seria chamada a governar. Depois de tudo o que aconteceu, ela não poderia contar com o PMDB liderado pelo seu agora desafeto, Michel Temer. Também não contaria com o PSDB e o DEM.
Até mesmo o PT já avisou em dois documentos recentes (O futuro está na retomada das mudanças, de fevereiro, e Resolução sobre Conjuntura, de maio) que, na avaliação do partido, a política econômica defendida por Joaquim Levy e Nelson Barbosa é excessivamente neoliberal e inaceitável, marcada pela “submissão aos imperativos do capital rentista”.
Como antevê graves dificuldades políticas para o restabelecimento de um nível mínimo de confiança, Dilma já adiantou que, além de convocar um plebiscito que antecipasse as eleições para um novo presidente da República, costuraria um pacto de governabilidade. Mas até mesmo para um projeto desses seria preciso condições políticas prévias, que muito dificilmente poderiam ser reunidas após o enorme desgaste produzido pelo processo do impeachment.
Não fosse por outras razões, a enorme dificuldade para garantir condições políticas de governo sugere que um eventual retorno da presidente Dilma produziria uma tempestade perfeita, principalmente se viesse acompanhada da alta do dólar no mercado internacional induzida pela alta de juros nos Estados Unidos e por novas denúncias demolidoras que viessem da Operação Lava Jato.
É um cenário que nem o PT quer ajudar a desenhar, pelo estrago que produziria nos seus projetos para as eleições de 2018.
CONFIRA
O desemprego continua aumentando e não dá sinais de redução. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua apontou para o trimestre móvel terminado em julho um índice de desocupação de 11,6%, que alcança 11,8 milhões de brasileiros. Dado mais alentador é o do rendimento médio real recebido pelo trabalhador, que manteve estabilidade em relação ao trimestre móvel terminado em fevereiro. Ainda não é possível enxergar o início da virada. O momento continua sendo de causa e efeito se reforçando. O desemprego reduz o consumo, que reduz a produção, que aumenta o desemprego.
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