Em palestra proferida em Washington na semana passada, o juiz federal Sérgio Moro deu diagnóstico realista sobre o atual momento político brasileiro. O magistrado asseverou que o país enfrenta um quadro de "corrupção endêmica", que não se resume ao megaesquema que saqueou a Petrobras. O mensalão e o petrolão, dois maiores delitos políticos da história recente brasileira - há quem diga que na verdade se trata de um único escândalo, continuado -, foram enquadrados pela Justiça. As ações criminosas promovidas de forma sistemática provocaram reação inédita das forças da lei, na figura de ministros de tribunais superiores, juízes de primeira instância, representantes do Ministério Público, da Polícia Federal e da Receita Federal.
O aparato da lei se mostra, contudo, insuficiente. Apesar dos inestimáveis serviços prestados pela Operação Lava-Jato, é ilusório acreditar que a iniciativa histórica será capaz de livrar o Brasil da chaga da corrupção. A moralização da administração pública constitui desafio que vai além de diligências investigatórias e exige comprometimento de todas as instâncias envolvidas. "Corrupção sistêmica não é e não pode ser um problema apenas do Poder Judiciário", alertou Moro.
Com efeito, dois poderes da República precisam demonstrar à sociedade autêntico e inabalável compromisso com a restituição da ética e o combate à corrupção. Representantes do Executivo e do Legislativo têm o dever de protagonizar uma descontaminação das práticas políticas. Na medida em que exerce papel fundamental na gestão de recursos públicos, o governo ocupa posição crítica nesse contexto. "O governo é o principal ator responsável por criar um ambiente político e econômico livre de corrupção sistêmica", continua Sérgio Moro.
Por essas razões, preocupam os movimentos protelatórios contra o estabelecimento de um marco no combate à criminalidade de colarinho branco. Feita a pedido do governo Temer, a retirada do caráter de urgência em três projetos de lei que ampliam as punições a funcionários públicos e a partidos políticos envolvidos em desvio de dinheiro joga para futuro incerto o esforço de se mudar a realidade brasileira. Também causa espécie a morosidade no Congresso com a proposta apresentada pelo Ministério Público Federal das Dez Medidas contra a Corrupção. Encaminhado em março com o respaldo popular de mais de 2 milhões de assinaturas, o conjunto de regras sugeridas aguarda análise. Uma comissão foi formada em junho e instalada no último dia 13. Em uma perspectiva otimista, os trabalhos iniciam após o recesso branco.
Recém-eleito presidente da Câmara, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) pretende virar uma página do Legislativo. Foi recebido de forma auspiciosa por Renan Calheiros e Michel Temer. Espera-se que a nova configuração em Brasília observe os alertas e os anseios de quem preza a ética e cumpra o dever de retirar do Brasil a pecha de país corrupto.
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