Mundo virá para a Olimpíada do Rio com os nervos à flor da pele. Quem fizesse um cenário bem negativo, quando o Rio foi escolhido para sediar a Olimpíada de 2016, não teria chegado a tanto. A realidade tem sido mais forte. O mundo virá para o Rio com os nervos à flor da pele. O Brasil receberá atletas e visitantes com um medo novo, o do terrorismo, e com velhos problemas aflorados. O Rio está em calamidade fiscal declarada pelo governador e o país tem dois presidentes.
Faltando 20 dias para o começo dos jogos, a França teve o terceiro ataque terrorista em 18 meses. O atentado em Nice lembra que qualquer coisa pode virar arma de destruição. Um caminhão numa avenida lotada de famílias comemorando o dia nacional, por exemplo. A imaginação de quem faz a segurança tem que superar a capacidade da mente doentia do terror.
O pano de fundo da nossa Olimpíada será este. A radicalização das tensões no mundo no meio de uma onda de terrorismo em grande escala. O Brasil, que sempre se considerou distante desse tipo de problema, agora precisa se preparar meticulosamente para proteger a nossa população e os atletas olímpicos. É o caso, sem dúvida, de fazer o que está sendo feito: rever todo o protocolo e dobrar todas as medidas de segurança.
Não são fatos comparados, mas aqui vivemos as nossas próprias mazelas. Era para ser diferente. Ser o momento em que comemoraríamos a limpeza da Baía de Guanabara, como aconteceu na Baía de Sydney. Ou a apresentação de uma cidade renovada, como aconteceu em Barcelona.
A segurança no Rio passou por um ciclo virtuoso em que pela primeira vez em muitos anos o morador da cidade pôde circular por áreas antes dominadas pelo tráfico. Os moradores dos bairros onde há mais violência tiveram pela primeira vez a presença do Estado. Flertamos com a esperança de resolver um problema que parecia insolúvel. Hoje há um desânimo como se tudo tivesse se perdido. Não é verdade, mas a sensação de retrocesso está no ambiente da cidade e nas estatísticas de mortes.
O desmonte das boas notícias do Rio ocorreu por erro na gestão das contas públicas. Aproveitou-se uma elevação de receitas temporárias para aumento de despesas permanentes. O Rio foi o estado que teve o maior aumento de gastos com a folha salarial, segundo a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi.
Haverá ganhos permanentes no setor de transportes do Rio, mas muito menores do que o programado. Houve a recuperação do centro do Rio e isso será um importante legado, mas a sombra da dúvida de corrupção em algumas das obras paira sobre o contribuinte, o pagador de todas as contas.
Um dos planos que o Rio e o Brasil tinham era o de aproveitar os grandes eventos internacionais aqui e alavancar a indústria do turismo. Havia exemplos de sucesso. O maior deles foi o de Barcelona.
Segundo dados do Banco Mundial, o número de visitantes na Espanha cresceu quase 70% nos dez anos antes da Olimpíada de Barcelona e dobrou nos 10 anos seguintes. Na Grécia também houve isso, apesar de a Olimpíada de Atenas estar na lista das que deixaram mais problemas. No caso, uma grande dívida. O Brasil teve apenas um pequeno aumento de 10% de turistas no ano da Copa. O professor Mauro Rochlin, da FGV, acha que o exemplo do Rio vai esvaziar o interesse de países emergentes de sediar um evento desse porte.
— O foco nos grandes eventos foi uma escolha equivocada do país. O caderno de encargos é extenso e muito caro. O Brasil convidou o mundo para apresentar os problemas que não conseguiu resolver — diz Rochlin.
A Olimpíada pode dar certo ou dar errado. Montreal ficou com uma dívida que levou 30 anos para pagar. Sydney tirou nove milhões de metros cúbicos de lixo de 160 hectares de vias navegáveis. Atenas ficou marcada por desvios e fraudes nas obras. O Rio está imerso em uma crise desconcertante, com atrasos de salários de funcionários, policiais fazendo manifestações em aeroportos carregando cartazes onde se lê “Bem-vindo ao inferno”, e com o prefeito Eduardo Paes avaliando que os jogos foram uma oportunidade desperdiçada.
Ninguém imaginou cenário tão difícil. E no meio de tudo há até o fato exótico de submetermos as autoridades estrangeiras ao constrangimento de não saber que presidente cumprimentar. Mesmo assim, eles chegarão: os visitantes e os anéis olímpicos. É esperar e torcer.
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