Por assumir o risco dos empreendimentos, seguradoras zelam pela qualidade dos projetos e das construções, função que governos não conseguem exercer
A tragédia do desabamento, com mortes, de trecho da ciclovia da Avenida Niemeyer, a Tim Maia, recém-inaugurada, veio ampliar o debate que já se trava há algum tempo sobre o sistema de contratação de obras pelo poder público.
Ramo de grandes negócios quase sempre envoltos em suspeições, causa de ruidosos escândalos, a execução de obras para governos, em todos os níveis, ainda desafia legisladores e administradores públicos a encontrar um modelo que ao mesmo tempo poupe o dinheiro do contribuinte e dê segurança à população.
Um debate já em andamento diz respeito ao Regime Diferenciado de Contratações (RDC), instituído inicialmente na esfera federal para dar velocidade à construção e reformas de estádios para a Copa de 2014. Por este sistema, as licitações são feitas sem projeto executivo, cuja responsabilidade fica com o empreiteiro construtor. Ganha-se tempo, mas se abre espaço para superfaturamentos, porque o contratante, o governo, não tem as especificações técnicas da obra. Ou não participa da sua definição. Por medida provisória, esse modelo foi estendido para toda obra pública feita na Federação, uma temeridade.
O desastre na ciclovia da Niemeyer — em que o projeto básico foi feito pela prefeitura e o executivo, o plano detalhado de construção, pela empreiteira, a Concremat — coloca na pauta do debate outra questão importante: falta uma terceira parte no circuito de contratação de obras, para fazer a intermediação entre contratante e contratada, com a preocupação exclusiva de garantir obras de boa qualidade, em todos os sentidos, e a preços compatíveis.
O modelo existe e funciona nos Estados Unidos desde o final do século XIX, quando começou a ser instituído um sistema de seguros para obras públicas. Há modalidades deles. Na essência, trata-se de colocar uma seguradora no meio desse negócio.
Por assumir o risco da construção e da consecução do que foi projetado, ela tem todo o cuidado em avaliar o perfil do construtor, a qualidade dos projetos — básico e executivo — e a sua implementação.
A Lei de Licitações, a 8.666, em fase de revisão no Congresso, prevê que as empreiteiras de obras públicas ofereçam uma garantia no valor de 5% até10% do valor da edificação. Não é o suficiente, como se constata. Nos debates sobre a 8.666, aprovada em 1993, tratou-se da obrigatoriedade do seguro. Consta que o lobby de empreiteiras a derrubou. Está aí o resultado: obras mal acabadas que estouram orçamentos , reparos constantes e acidentes.
Haveria a possibilidade de, na revisão da lei, corrigir-se o erro. Mas há sempre o argumento de que o seguro total encarecerá as obras. É certo, mas quanto custam a interdição de uma ciclovia como a da Niemeyer, a reparação do trecho que desabou e as mortes?
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