O Estado de S. Paulo - 08/05
Não há condições neste momento para se pensar numa redução de juros, porque a inflação continua elevada, apesar da queda recente, e as contas públicas permanecem muito desajustadas e sem perspectiva clara de melhora. Esta é a principal mensagem contida na ata da última reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC). Em sua próxima reunião, marcada para os dias 7 e 8 de junho, o comitê quase certamente ainda será formado pelos mesmos diretores do BC, mesmo no caso de substituição da presidente Dilma Rousseff pelo vice Michel Temer. Será uma surpresa se decidirem afrouxar as condições de crédito, porque até lá qualquer mudança do cenário fiscal provavelmente será para pior. O afastamento da presidente poderá tornar o mercado mais otimista, mas o novo governo ainda terá de mostrar como iniciará o conserto das finanças públicas.
É possível, com base na ata divulgada na quinta-feira passada, avaliar com maior segurança a decisão do Copom, anunciada na semana anterior, de manter os juros básicos em 14,25%. A avaliação imediata indicou uma atitude prudente. Diante da provável mudança na cúpula do Executivo, e no próprio BC, seria razoável manter as condições da política monetária e deixar qualquer mudança importante para a próxima equipe. Seria uma atitude civilizada, muito diferente daquela escolhida pela presidente Dilma Rousseff quando resolveu deixar uma coleção de bombas no caminho de seu substituto. Não há por que duvidar da atitude civilizada, mas o relatório recém-divulgado mostra algo mais que isso.
Mesmo diante de uma provável mudança de governo e de equipe econômica, os membros do Copom exerceram plenamente sua função, tomando uma decisão tecnicamente fundamentada e apresentando razões e advertências de enorme importância. Para começar, mostraram-se muito mais cautelosos diante do recente recuo da inflação do que muitos analistas do setor financeiro.
A rejeição da hipótese de redução de juros, nas atuais condições da economia, aparece duas vezes no documento. Não há espaço para “flexibilização da política monetária”, indicam os autores da ata, porque a inflação em 12 meses permanece elevada e as expectativas continuam distantes “dos objetivos do regime de metas”. Essa é a primeira menção ao tema. Na segunda, três parágrafos adiante, o “cenário central” impede “trabalhar com a hipótese de flexibilização”. O mais prudente, nesta altura, é levar a sério essa insistência.
Não há ilusões quanto às causas do recuo da inflação. O documento menciona a contenção do crédito e o baixo nível da atividade, apontando tanto a queda do investimento quanto a redução do consumo, “em linha com os dados de crédito, emprego e renda”. Em suma, a inflação tem caído por causa da recessão e dos juros altos, num processo “especialmente intensificado pelas incertezas oriundas do efeito de eventos não econômicos”. Em português corrente: a crise política tem tornado o cenário mais incerto, aumentando o temor de empresários e consumidores e agravando a recessão.
Mas bastam esses fatores para derrubar a inflação de forma duradoura? Esta é uma pergunta importante e a resposta contida na ata é negativa. Não pode haver segurança enquanto as contas públicas permanecerem seriamente desajustadas. O balanço do setor público, segundo o documento, “encontra-se em zona expansionista”. O texto acentua os maus efeitos das “indefinições e alterações significativas na trajetória de geração de resultados primários, bem como na sua composição”.
Isso é um resumo, em linguagem de banco central, dos tropeços da política orçamentária, marcada pela insegurança, pelas frequentes mudanças da meta e pela piora das expectativas em relação aos resultados. Nesta altura, mesmo a hipótese de um déficit primário de R$ 96,65 bilhões, admitida pelo governo, parece otimista. Não há referência explícita a esse número, mas a crítica é muito clara. A advertência vale com ou sem impeachment.
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