terça-feira, março 29, 2016

Sem choro nem vela - JOSEF BARAT

O ESTADO DE S. PAULO - 29/03

Não é preciso chorar nem acender vela para este governo agonizante. Basta uma fita verde e amarela - sem o nome dela. Apesar da ruína, o Brasil está vivo e com esperança num futuro melhor. Está consciente de quanto custou a incompetência de um governo dedicado obstinadamente a errar. A impressionante mobilização popular mostrou que a absoluta maioria dos que trabalham (ou perderam seu emprego) e pagam pesados impostos não quer mais ser refém dos que se julgam eternos donos do poder.

Diante deste ambiente angustiante de recessão, desemprego, inflação, descontrole total das contas públicas e descrédito internacional, o que se tem como resposta? O governo nos oferece arrogância, perda do senso do ridículo, falta de respeito e insistência em repetir os erros. Emendas são alardeadas - cada vez mais mambembes que os sonetos - num jogo de prestidigitação que envergonha mágicos profissionais. E que razões levam às ruas multidões? Elas se sentem atingidas pela afronta, desfaçatez e deboche. E por que um ex-presidente que deixou um legado importante se presta a protagonizar um papel ridículo e degradante?

E importante entender como foi meticulosamente gerado o caos econômico. O primeiro governo Lula tirou partido de uma conjunção favorável: preservação do poder de compra pelo controle da inflação, expansão e diversificação do consumo com suporte da expansão do crédito e o câmbio favorável às importações. Além disso, baratearam-se os bens industriais de consumo, em razão das cadeias produtivas globalizadas. Um legado inegável foi o maior alcance dos programas de redistribuição de renda e inclusão social. O cenário internacional favoreceu o grande impulso nas exportações, apoiado num prolongado ciclo de valorização das commodities. Houve, ainda, continuidade na atração do capital privado para investimentos, inclusive em infraestrutura. Por fim, preservaram-se a credibilidade e a atratividade do País, que obteve o grau de investimento.

Mas, no segundo governo Lula, já se viam sinais de esgotamento do ciclo baseado na expansão do consumo e baixa capacidade de investimento. Buscou-se como alternativa para dinamizar o crescimento um novo nacional-desenvolvimentismo, uma visão ideológica reciclada que apostou na economia cada vez mais apoiada no voluntarismo do Estado intervencionista. Foram resgatados antigos conceitos da liderança estatal nos investimentos, expansão do crédito e concessão de benefícios fiscais a setores "estratégicos". A política econômica foi dispersiva e sem coordenação de objetivos.

O primeiro governo Dilma herdou as dificuldades geradas pelo esgotamento do ciclo de expansão do consumo e, atingido pela crise de 2009, optou por aprofundar mais as ações intervencionistas. Alterou a direção da política econômica, com a chamada nova matriz econômica. A média da inflação nos primeiros quatro anos foi de 6%, batendo no teto da meta estabelecida. O represamento das tarifas dos combustíveis e da energia elétrica impediu que a inflação ultrapassasse o teto. Excetuando o crescimento de 2010 (7,5%), o desempenho do PIB foi medíocre no período. A taxa de investimento, com média de 18%, continuou a ser o grande fator restritivo para um crescimento mais forte e continuado.

A nova matriz cedeu mais espaço para os ideológicos, afrouxando os controles sobre os gastos públicos e os objetivos de superávit primário. Pôs em risco o controle da inflação - sempre batendo no teto da meta. Aprofundaram-se, ainda, as medidas pontuais de isenções fiscais e favorecimentos de crédito pelos bancos oficiais. O segundo mandato, mal iniciado, já revelava uma economia com gastos públicos sempre crescentes, inflação fora de controle, desemprego em dois dígitos, queda forte e continuada do PIB e aumento da dívida pública.

Não foi surpresa, portanto, o País quebrar e mergulhar na mais prolongada e grave recessão de sua história. Não tendo mais a quem culpar, os donos do poder perderam a compostura e partiram para o achincalhe.

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