História recorrente: viajo para o Brasil com o propósito simpático de conhecer leitores, assinar livros, conversar sobre as banalidades da vida.
Fatalmente, surge o momento da confissão: o leitor aproxima-se e, com voz clandestina, pede para eu escrever mais livros. Na universidade onde ele estuda, o fechamento intelectual é absoluto.
Pensadores conservadores são inexistentes. Ideologias mais liberais, ou libertárias, idem.
Fico sempre atônito com essas descrições. Serão verdadeiras? Serão exagero? Ou os alunos brasileiros que eu conheço têm o supremo azar de estudar em instituições bolcheviques que ainda vivem em 1917?
Alguns, mais temerários, perguntam-me ou escrevem-me com uma questão de vida ou morte: haverá algum lugar no planeta -ou, pelo menos, em Portugal- onde seja possível estudar história ou ciência política sem ter o cérebro sequestrado pelas vulgatas marxistas?
As minhas respostas são sempre lacônicas e pasmadas: aconselho livros, professores; e prometo continuar a publicar. Mas agora tenho um novo argumento nas mãos: os alunos brasileiros, apesar de aprisionados, ainda conservam uma réstia de sanidade -a sanidade própria de quem sabe que existe outro caminho. Na Europa, e sobretudo na Inglaterra, o manicômio é muito pior.
Que o diga Nick Cohen, em artigo para "The Spectator". Conta Cohen que, no Reino Unido, o número de universidades que ainda podem legitimamente usar esse nome -espaços de livre debate onde é possível escutar o que não gostamos e argumentar o que queremos- está em vias de extinção.
Tradicionalmente, a universidade servia para confrontar o estudante com ideias novas, por vezes desconfortáveis, mas seguramente diferentes do mundo estreito onde ele viveu a adolescência. A universidade era um espaço de adultos e para adultos.
Hoje, as universidades são "lugares de segurança" onde qualquer sombra de insulto à cartilha multiculturalista é tratada com violência e segregação.
Nick Cohen dá exemplos recentes. No King's College de Londres, uma das melhores universidades, um professor da casa tentou promover um debate sob o título: "Será que o Ocidente é responsável pelo extremismo islâmico?"
Essa pergunta, formulada nesses termos, já é uma concessão à mentalidade fanática dos fanáticos.
Mas nem assim eles acalmaram. Quando se pergunta se o Ocidente é responsável pelo extremismo islâmico, existe sempre a possibilidade insana de alguém dizer "não".
De que vale fazer um debate quando as conclusões podem ser contrárias às nossas opiniões primárias (no duplo sentido da palavra)? Precisamente: melhor não fazer debate nenhum. O risco é elevado.
Não foi caso único. Na mesma cidade, o University College tentou organizar um outro debate para discutir o papel da população curda na luta contra o Estado Islâmico. A sessão, aliás, teria como convidado um ex-aluno da universidade, Macer Gifford, que lutara com os curdos na Síria.
Logo se levantaram vozes contra. Na douta opinião dos estudantes, existem sempre dois lados em qualquer conflito. Não seria preferível escutar ambos?
Longe de mim contestar esse "pensamento". Mas será que o pessoal do Estado Islâmico, ocupado a organizar os seus massacres, teria alguém com disponibilidade para enviar à universidade?
E, em caso afirmativo, será que a morte do combatente e ex-estudante Macer Gifford em pleno debate seria um argumento válido para a discussão?
Não sabemos. Mas por pouco tempo: com o Estado Islâmico a operar na Turquia, na França, na Bélgica e a ocupar o vazio de liderança aqui perto, na Líbia, rapidamente a Europa terá mais contato com os jihadistas.
Não excluo, aliás, que alguns deles possam participar de seminários ou até dar aulas nas universidades europeias.
Nada contra: se os professores de humanidades, dominados pela sharia do multiculturalismo, não servem para grande coisa, um jihadista sempre seria útil para ensinar o fabrico de bombas ou a melhor forma de decapitar um herege ajoelhado.
Como diz o povo, conhecimento não ocupa lugar.
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