O Estado de S. Paulo - 17/05
O texto aprovado na Câmara acaba ou não acaba com o fator previdenciário, criado pelo governo Fernando Henrique Cardoso, em 1999, para limitar as aposentadorias precoces? Há controvérsias. Uns acham que acaba, outros dizem que não. Michel Temer, vice-presidente e coordenador político do governo, me disse que não: “Houve muito entusiasmo com o fim do fator, mas essa é uma interpretação equivocada. Não foi o fim, foi uma adequação”.
De fato, a Câmara só criou novas fórmulas: a soma da idade e do tempo de contribuição tem de dar 95 para homens e 85 para mulheres. Logo, o fator mudou, mas continua. Continuando ou não, foi uma forte derrota para a presidente Dilma Rousseff. Vai na contramão do ajuste fiscal; tem impacto nas contas da Previdência; confirma a insubordinação da base aliada. Motivo para festejar o governo não tem.
Para Temer, o importante é “uma solução rápida”. Por isso, ele proporá amanhã aos líderes aliados que o Fórum de Debates sobre Política de Emprego, Trabalho, Renda e Previdência, criado por Dilma e centrais sindicais, sugira em 60 dias um modelo alternativo para o fator previdenciário, ou seu sucedâneo. O prazo para as demais discussões do fórum continuaria sendo de 180 dias.
A pressa faz sentido, porque o neo-oposicionista Renan Calheiros já avisou que a mudança vai passar no Senado e isso deixaria a presidente entre a cruz e a espada. Se não vetar, pode comprometer ainda mais a Previdência. Se vetar, vai bater de frente com o Congresso e com a opinião pública. Ela não está com essa bola para mais esse desgaste.
Já no dia seguinte à vitória na MP previdenciária e à derrota no fator previdenciário, Michel Temer reuniu os líderes aliados e virou uma baita lavação de roupa suja. “Deixei todos litigarem à vontade e depois disse: ‘Isso foi ontem, quero ver hoje’”, relatou ele, lembrando que, além do fator, havia destaques que poderiam desvirtuar ainda mais o objetivo da MP. No fim, PDT, PC do B e PTB, por exemplo, recuaram em alguns pontos.
“Deu certo. A quinta-feira foi tranquila”, disse o vice, me fazendo lembrar a velha expressão: “A cada dia sua agonia”. Haja agonia! E ainda falta amansar o Senado, que vota nesta semana a MP trabalhista e o nome de Luiz Fachin para o STF. “Acho que passam”, limitou-se a dizer Temer, confessando não ter a menor ideia do que Calheiros conversou com o ex-presidente Lula na quinta. Curioso ele não saber. Ou nem tanto?
Outra cumbuca em que ele não quis meter a mão foi a brigalhada no PT, depois que o relator da MP previdenciária, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), encaminhou a favor da mudança no fator previdenciário. Se o relator petista dá de ombros para o Planalto, por que PMDB, PTB, PDT, PP.... deveriam ser fiéis?
Se não tem nada a dizer sobre petistas, Temer assume que tem bons contatos no lado oposto – na oposição. “Me dou bem com todos eles e é claro que essas questões (ajuste e fator previdenciário) não são para hoje, não são questões de governo, são de Estado.” Aliás, o vice resume seu argumento para atrair os votos do DEM, decisivos para aprovar a MP trabalhista: “Hoje, somos nós que estamos no governo. Amanhã, serão vocês...”
Mesmo que o vice não admita, tudo indica que há dois objetivos na estratégia de encomendar ao fórum das centrais uma saída para o fator previdenciário. Um é fazer do limão uma limonada, dando ao governo e ao PT o bônus político de rever a “maldade do FHC”. Outro é sacar um modelo que não tenha impacto agora, só nos governos futuros – quem sabe, governos da atual oposição?
Frio, elegante, gentil, Temer falou sobre a coordenação política: “Eu não poderia recusar. É um sacrifício, a tarefa é dificílima e estou trabalhando 24 horas por dia, mas está dando certo”. Poderíamos acrescentar: apesar do seu PMDB, do PT de Dilma e desses estranhos aliados. Se é que está dando certo mesmo...
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