folha de sp -21/12
Discursos da presidente e dos ministros criam ruído sobre a transição na economia
DÁ O QUE PENSAR o discurso de diplomação da presidente reeleita Dilma Rousseff. Que tumulto de transmigração de alma haveria ali entre Dilma 1 e Dilma 2, que mistura adúltera de tudo, que foi sem ter ido, com nomes demais para ter um nome, como dizia o poema de Tristan Corbière? Desculpem a citação, tão mal alocada quanto o capital da Petrobras.
Na despedida, os economistas de Dilma 1 acabam de reafirmar aquilo que os economistas de Dilma 2 acabam de desdizer, com a anuência aparente das duas presidentes.
Além do mais, ao ser diplomada como Dilma 2, a presidente voltou a atribuir a críticos a responsabilidade por feitos de Dilma 1, alguns dos quais de resto reafirma.
"Temos que saber apurar e saber punir, sem enfraquecer a Petrobras... Temos que continuar apostando na melhoria da governança, no modelo de partilha para o pré-sal e na vitoriosa política de conteúdo local. Temos que continuar acreditando na mais brasileira das nossas empresas, porque ela só poderá continuar servindo bem ao país se for cada vez mais brasileira", discursou a presidente, nacional-desenvolvimentista confirmada nestas palavras, com as quais de resto chama de "entreguistas" quaisquer críticos da gestão ruinosa da empresa.
Foi a política padrão de Dilma 1 que enfraqueceu tanto a Petrobras quanto o Tesouro Nacional. Uma política de negligência com endividamentos insustentáveis, de descaso com a restrição orçamentária e desdém pela ideia de que podem existir usos mais eficientes de recursos mesmo, ou principalmente, quando tais escolhas não ratificam lendas do nacional-empresismo que entre os anos 1950 e 1980 ajudou a cimentar uma das sociedades mais desiguais do mundo.
Em algumas ocasiões, em becos sem saída, Dilma 1 deu o braço quebrado a torcer: na privatização dos aeroportos, na revisão das concessões de estradas. Mas o que esta- ria se passando entre ela e seus botões, agora que aprovou ao menos um plano inicial de desmanche da política econômica do seu primeiro mandato?
Ainda que a política Dilma 1 tenha chegado a um limite evidente, segundo as ideias da própria presidente e de ministros fiéis, uns de saída, outros restantes, o caso seria de "dobrar a aposta", de dar mais remédio "anticíclico", não de dieta, de "ajuste".
Na diplomação, a presidente ofereceu "luta renovada" pela "estabilidade fundada no crescimento sustentado, no controle da inflação, no crescimento que vai se acelerar mais rápido do que alguns imaginam". Quem "imaginam"? Os que criticavam a política de Dilma 1 ou os que lamentam a "guinada ortodoxa" de Dilma 2?
Em agosto de 2013, o colunista escrevia isto, aqui: "De mãos quase atadas, pois não tem como manejar o gasto público e os juros sobem, dada a inflação persistente, o governo agora limita o diálogo público a queixas sobre o pessimismo de seus críticos ou inimigos".
"[Dilma] Não revê o seu curso apenas porque está emparedada pela eleição próxima, a qual poderia perder se mexesse a fundo na economia?... Ou teimosa e iludida acredita que foi vítima dos azares de um mundo conturbado e do pessimismo de adversários?"
De certo modo, o mistério permanece.
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