O GLOBO - 21/12
A presidente Dilma, que colheu nas urnas em outubro uma vitória tão difícil quanto a situação econômica que legou a si própria, não teve tempo de curtir a reeleição, nem está tendo condições políticas de montar um segundo governo que traga esperanças de melhores dias nos próximos quatro anos.
A escolha do economista ortodoxo Joaquim Levy para assumir um Ministério da Fazenda quase emergencial só fez realçar as incongruências da montagem do novo governo, pois os gastos escondidos no Orçamento, a cada momento descobertos, fazem com que o estranho no ninho tenha que refazer seus projetos de controle de gastos para colocar uma ordem mínima na bagunça estabelecida.
Pressionada pelo escândalo da Petrobras, que não a deixa livrar-se das suspeitas que recaem sobre sua protegida Graça Foster e respingam nela mesma - que chefiou o setor nos últimos dez anos como ministra das Minas e Energia e chefe da Casa Civil da Presidência -, Dilma não consegue montar o quebra-cabeça de seu novo Ministério porque também aí há uma incoerência básica.
O Ministério é montado na base da divisão de feudos entre os partidos aliados, e foi esse conceito que desencadeou os escândalos em série que atingiram o PT desde o mensalão. Os partidos políticos, por sua vez, estão acuados com as diversas listas que pipocam no noticiário político, levando deputados e senadores de vários partidos a passarem para o noticiário policial sem escalas.
Como nomear ministros que podem estar em breve no banco dos réus? Como eleger novamente Renan Calheiros presidente do Senado, se ele está na lista dos delatados pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e pode estar também na do doleiro Alberto Youssef? Mas também com que força política a presidente contará para desagradar a Renan Calheiros?
Constrangida ou não, Dilma continua a negociar com os partidos como se nada tivesse acontecido nos últimos dias.
Renan é quem distribui os cargos devidos ao PMDB do Senado, e confunde sua campanha para voltar a presidi-lo com os interesses de seus aliados, levando, inexoravelmente, o segundo Ministério de Dilma a se envolver com tenebrosas transações que um dia podem cobrar seu custo institucional.
A presidente Dilma, que propôs um pacto contra a corrupção ao mesmo tempo em que seu governo se envolve dia após dia nas teias das negociatas geridas pela Petrobras nos últimos dez anos, não tem como organizar um Ministério de homens acima de qualquer suspeita, e revela, com isso, os enredos subterrâneos que se desenvolvem sem que tenha condições de freá-los, pois é beneficiária deles.
Esse baixo-astral que domina o país, e já é registrado pelos próprios petistas, deve-se à realidade que cerca o atual governo, e continuará prevalecendo nos próximos anos: economia debilitada, podendo chegar a um PIB negativo ainda este ano ou no próximo, ou nos dois, o mais provável; e política caótica, com o PT dividido entre os que "amadureceram" na definição da própria Dilma, e os que continuam renegando as necessárias flexibilizações em nome de um esquerdismo que já não arrebata as multidões - e muitas vezes apenas esconde interesses subalternos revelados por delações premiadas de bandidos dos mais diversos estratos sociais.
Além disso, a base aliada já foi mais fiel, e a cada dia se afasta mais do centro decisório do Palácio do Planalto, seja porque Dilma divide com muito poucos suas dúvidas (as terá?), ou porque eles mesmos já sentem o vento virar em outras direções.
A popularidade da presidente medida pelos institutos de pesquisas parece resistir bem aos infortúnios, mas até ela sabe que essa resiliência não resistirá às medidas severas que serão inevitavelmente tomadas pela nova equipe econômica. Pelo menos os dois primeiros anos do novo governo serão conturbados, e não há nenhuma indicação de que o governo tenha cartas na manga para reverter a situação. Nem que tenha consistência programática para segurar o leme quando a tempestade exigir firmeza da comandante.
Feliz Natal a todos. A coluna volta a ser publicada no dia 26.
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