GAZETA DO POVO - PR - 15/11
Adiamento da divulgação do balanço é consequência da confusão em que as administrações recentes colocaram a estatal
Nestes dias, investidores grandes e pequenos ficam atentos à divulgação dos balanços das mais diversas empresas, que publicam os resultados do terceiro trimestre. Os números orientam as estratégias de investimento e permitem avaliar a saúde financeira das empresas. No entanto, essa temporada de balanços terá uma baixa significativa: a maior empresa brasileira, a Petrobras, avisou já na quinta-feira que não cumpriria o prazo dado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que expirou ontem. Se tudo der certo, quem sabe em 12 de dezembro devem sair os números – ainda assim, sem a confirmação da auditoria externa da PricewaterhouseCoopers (PwC).
A nota da Petrobras oferece a justificativa: “Em decorrência do tempo necessário para (i) se obter maior aprofundamento nas investigações em curso pelos escritórios contratados (ii) proceder aos possíveis ajustes nas demonstrações contábeis com base nas denúncias e investigações relacionadas à ‘Operaçao Lava Jato’; e (iii) avaliar a necessidade de melhorias nos controles internos, a Companhia não está pronta para divulgar as demonstrações contábeis referentes ao terceiro trimestre de 2014 nesta data [14 de novembro]”.
Eis mais uma consequência da confusão provocada ao longo desses últimos anos de administração petista da empresa. A estatal que, até pouco tempo atrás, era mais conhecida por ser referência mundial em prospecção de petróleo em águas profundas, que havia descoberto o pré-sal, agora não sai do noticiário devido a investigações mil, tanto no Brasil quanto no exterior. Por aqui, a Operação Lava Jato levou a dezenas de novas prisões ontem, incluindo presidentes e diretores de grandes empreiteiras, além de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras. Nos Estados Unidos, a Securities and Exchange Commission (SEC, o equivalente norte-americano da CVM) já estava no caso, pois a Petrobras tem ações comercializadas na Bolsa de Nova York. E, na Holanda, a SBM Offshore, fabricante de plataformas marítimas de exploração de petróleo, fez um acordo com o governo de seu país e aceitou pagar US$ 240 milhões para não ser processada por oferecer propinas para obter contratos em vários países, inclusive o Brasil – curiosamente, uma comissão interna da Petrobras, formada para investigar as denúncias de suborno, não encontrou indício nenhum de irregularidade.
O episódio da SBM, em que a Petrobras foi incapaz de enxergar o que estava diante dos olhos, mostra que a PwC realmente teria pouquíssimos motivos para endossar quaisquer números que forem apresentados pela estatal sem que estejam concluídas as investigações que realmente interessam – e as prisões de ontem podem levar a novas revelações sobre o suposto esquema de propinas que teria virado regra dentro da estatal. A credibilidade da Petrobras está sendo lentamente minada pela irresponsabilidade na condução da empresa, não apenas por causa das denúncias de corrupção, mas também por decisões populistas como a que manteve o preço da gasolina artificialmente baixo, mesmo que isso custasse grande prejuízo à companhia.
O governo abusa da retórica de “mandar investigar” (uma falácia, já que Polícia Federal, Ministério Público e Controladoria-Geral da União são órgãos de Estado, e não de governo, e têm a obrigação de investigar independentemente do que pense o mandatário de plantão), mas é o maior protagonista da “operação abafa” que tem transformado em teatro as CPIs no Congresso Nacional – embora às vezes conte com a ajuda da oposição, como no recente episódio do acordo para barrar a convocação de políticos de vários partidos para que prestassem depoimento.
Na nota ao mercado, a estatal afirma que, “como é de conhecimento público, a Petrobras passa por um momento único em sua história”. É triste que esse “momento único” não esteja ocorrendo em função da notória capacidade técnica de seus funcionários, mas da descoberta de um esquema destinado a sangrar a companhia em benefício de alguns partidos políticos, que a “privatizaram” em proveito próprio, fazendo com a empresa aquilo de que o petismo sempre acusou seus adversários.
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