Sem tarifaço, mas também sem crescimento econômico, o Brasil da presidente Dilma Rousseff acumulou de janeiro a julho inflação de 3,76%. Essa taxa é maior que a prevista para o ano inteiro em vários vizinhos mais dinâmicos - Chile, Colômbia, Equador e Peru. Até o fim do ano a inflação brasileira baterá também, se nenhuma grande surpresa ocorrer, a do Paraguai e a do México, segunda maior economia latino-americana. Por enquanto, o governo pode alardear mais um bom resultado parcial. No mês passado, a taxa caiu para 0,01%. A queda foi causada principalmente pelo recuo dos preços dos alimentos e pelo ajuste pós-Copa, observado, por exemplo, nas tarifas de transporte aéreo. A variação acumulada em 12 meses ficou em 6,5%, no limite da margem de tolerância.
O acumulado poderá diminuir até dezembro, mas continuará bem acima da meta, 4,5%. Para evitar um impulso maior o governo continuará contendo as tarifas de eletricidade. Poderá permitir ajustes limitados. Enquanto isso, as distribuidoras de energia, socorridas com novo empréstimo de R$ 6,6 bilhões, acumularão novas dívidas.
Haverá um repique da inflação, depois de alguns meses de recuo. Isso ocorreu em todos os anos a partir de 2010. No ano passado foi em agosto, quando a taxa passou de 0,03% para 0,24%. Neste ano, os economistas do mercado previram também para agosto o começo da nova aceleração. Poderão errar por um mês, dificilmente por dois. Os fatores inflacionários mais importantes continuam presentes. A gastança federal permanece, o crédito aumenta e o governo manteve os estímulos fiscais ao consumo. Ainda haverá muito alimento para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a referência oficial para a política anti-inflacionária. Falta saber se os juros básicos de 11% ao ano ainda produzirão efeitos e se a piora das condições de emprego assustará os consumidores e ajudará a frear os preços.
A queda de qualidade do emprego é indiscutível. A melhor empregadora, a indústria, continua demitindo. Além disso, as condições de ocupação nas fábricas estão mais precárias. No setor automobilístico, a adoção do lay-off - suspensão temporária de contratos - aumentou a insegurança. A criação de vagas tem ocorrido principalmente no comércio e nos serviços - mas a maior parte dos serviços, no Brasil, oferece condições de ocupação muito diferentes das observadas nos países desenvolvidos. O chamado emprego decente ainda é encontrado principalmente na indústria, na administração pública e no setor financeiro.
O emprego industrial aumentou 1% em 2011, diminuiu 1,4% em 2012 e encolheu mais 1,1% no ano seguinte. A redução continuou este ano. No primeiro semestre, o número de ocupados na indústria foi 2,3% menor que entre janeiro e junho do ano passado. Em junho, foi 0,5% menor que em maio e 3,1% inferior ao de um ano antes. Estes números foram divulgados na sexta-feira, pouco antes dos novos dados da inflação oficial, no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Apesar disso, a folha de pagamento real da indústria, embora tenha diminuído em junho, ainda foi, no primeiro semestre, 1,3% maior que entre janeiro e junho do ano passado. O aumento do salário médio, portanto, superou a inflação, embora o pessoal empregado tenha diminuído. Isso se explica principalmente pela baixa oferta de mão de obra qualificada ou mesmo qualificável.
Mas o aumento real de salários e de outros custos continua afetando o poder de competição da maior parte da indústria. Apesar do forte estímulo ao consumo, a produção industrial ficou estagnada durante o atual governo. Aumentou 0,4% em 2011, diminuiu 2,3% em 2012 e cresceu apenas 2% em 2013, sem voltar ao nível de dois anos antes. No primeiro semestre deste ano ficou 2,6% abaixo do registrado até junho do ano passado.
Para a indústria a inflação alta dos últimos anos traduziu-se principalmente em custos cada vez maiores. O salário real cresceu mais que a produtividade. Os custos logísticos aumentaram, assim como o peso da burocracia estatal e dos encargos administrativos. O câmbio oscilou, mas a maior parte das fábricas foi incapaz de competir no mercado internacional mesmo nas fases de depreciação do real, quando os produtos brasileiros deveriam ficar mais baratos em dólares.
A inflação elevada atrapalhou duplamente. O efeito indireto foi a elevação de custos. O indireto ocorreu quando o Banco Central interveio no mercado para frear a valorização do dólar e atenuar os efeitos inflacionários do câmbio. Num país com inflação mais civilizada o desajuste cambial, para começar, seria menor ou nulo. Além disso, uma eventual valorização do dólar seria muito menos perigosa para a estabilidade de preços. No Brasil, o Banco Central foi criticado por intervir no câmbio para prevenir uma inflação maior. Os críticos podem ter alguma razão. Mas teriam sido mais eficientes se tivessem, há mais tempo, condenado a tolerância à inflação e cobrado medidas mais fortes e mais sérias contra o desajuste de preços.
O combate à inflação tem dependido só do Banco Central, enquanto o governo mantém o gasto excessivo e o uso ineficiente de recursos públicos. Além disso, a política industrial tem consistido, há muitos anos, de uma combinação ineficiente de protecionismo, favores a grupos e segmentos selecionados e estímulos ao consumo. Tudo isso se combinou com uma diplomacia econômica de centro acadêmico. Em 2002, as vendas de manufaturados corresponderam a 54,71% das exportações brasileiras. No ano passado essa fatia estava reduzida a 38,44%. Em parte por indução, em parte por simples comodismo, a indústria se ajustou ao papel de fornecedora do Mercosul e de mais uns poucos mercados. Consequência: hoje é incapaz de competir nessas áreas e até no mercado interno. Nada mais natural.
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