GAZETA DO POVO - PR - 13/04
Para enfrentar as sucessivas crises econômicas no atribulado governo João Goulart, o ministro Celso Furtado, do Planejamento, com a colaboração do ministro Santiago Dantas, da Fazenda, lançou o Plano Trienal de Desenvolvimento (1963-1965), com o objetivo de promover desenvolvimento sem inflação. O plano resultou em completo fracasso: em 1963, a inflação anual atingiu 79%, enquanto o crescimento do PIB limitou-se a 1%. Para prevenir o vácuo político, Goulart construiu um novo discurso, consistindo no anúncio das “reformas de base”. Era uma mixórdia de ideias mal alinhavadas, sem a devida correspondência com projetos que lhe dessem concretude. Vocalizadas no comício da Central do Brasil, em 13 de março de 1964, serviu tão-somente como um pretexto a mais para o golpe que resultou na deposição do presidente.
Distintamente do clima festivo das reformas de base, em setembro de 1963 foi instalada uma Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda, presidida por Simões Lopes. Originalmente focados na reestruturação administrativa daquele ministério, os trabalhos evoluíram para um projeto ambicioso de reforma tributária, cuja concepção final somente veio a ocorrer já no governo militar, com a constituição de uma comissão na qual se destacavam Rubens Gomes de Souza, Gilberto Ulhoa Canto, Gerson Augusto da Silva e Mário Henrique Simonsen.
Foram pródigos os frutos dessa comissão. O Brasil aderiu à tese da tributação sobre o valor agregado (antes limitada à França), com a instituição do IPI e do ICM. Além disso, construiu-se um consistente modelo de federalismo fiscal e editou-se o Código Tributário Nacional. Em seguida, foram feitas grandes mudanças na administração tributária: reestruturação das declarações do Imposto de Renda e, em caráter pioneiro em todo o mundo, fusão da administração federal de tributos internos com a aduaneira, criação de uma empresa de apoio informático para o Fisco (a Serpro) e arrecadação de impostos pela rede bancária.
Essa reforma é seguramente a mais importante reestruturação na tributação do consumo no Brasil, ainda que não estivesse limitada a esse objetivo. Sua implantação, entretanto, só se tornou possível por força das condições específicas de uma ditadura recém-instaurada, na qual eram escassas as possibilidades de reação.
A despeito de suas qualidades, o projeto cometeu um erro crucial e insanável quando atribuiu aos estados a titularidade do ICM (que hoje é o ICMS). Isso explica, em boa medida, a grande diversidade e consequente complexidade do imposto. A Constituição de 1988 agravou esse erro. O ICMS é, hoje, o principal problema tributário brasileiro, pois carga tributária relativamente elevada é matéria que remete a uma reestruturação do gasto público. Reformar o ICMS, todavia, é tarefa extremamente difícil, porque implica complexas negociações com os secretários de Fazenda, em que afloram grandes conflitos federativos que findam, quase sempre, em impasses.
Uma reforma plausível do ICMS deveria ser comedida, centrando-se em questões estratégicas (disciplinamento da competição fiscal, redução do número de alíquotas, restrições à redução da base de cálculo, regulamentação da substituição tributária, prevenção e liquidação dos créditos acumulados), sempre que possível com base em soluções infraconstitucionais. Esse processo só terá êxito se liderado pela União, em um contexto que inclua outros temas federativos.
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