FOLHA DE SP - 15/10
O Estado brasileiro, para reviver a imagem antiga, é um gigante com pés de barro. Cresce no ritmo ditado pela pretensão de seus governantes, mas tropeça na própria incompetência para cumprir as funções mais comezinhas, como manter um registro geral confiável de seus cidadãos.
"Registro geral", aliás, é significado da abreviação "RG", pela qual se popularizou a cédula de identidade, documento nacional de identificação civil. Cada brasileiro deve ter um --e parece óbvio que nenhum deles deve ter mais de um.
O repórter Reynaldo Turollo Jr., desta Folha, provou que o documento, no fundo, vale pouco enquanto título de identificação. Ele conseguiu obter RGs com seu próprio nome e suas impressões digitais em oito Estados. No nono, Minas Gerais, deu um passo além e obteve uma cédula com suas digitais, mas no nome de outrem.
Qualquer pessoa pode repetir a façanha, como sabem todos os estelionatários do país. Basta comparecer à repartição munido de uma certidão de nascimento ou de casamento e pedir a emissão da carteira. Afora eventuais filas, não há mistério --nem controle.
Parece incrível, numa época em que até as telecomunicações da Presidência da República são bisbilhotadas por sistemas de computadores, que os institutos estaduais de identificação não se comuniquem entre si.
Sem um sistema nacional para armazenar dados e impressões digitais, um Estado não tem como saber se outro já registrou determinada pessoa. Múltiplos documentos de identidade podem ser usados em fraudes como pedidos de aposentadoria em série.
O cadastro nacional de identidades está previsto em lei desde 1997. Chegou a ser anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2010 um RIC (Registro de Identidade Civil), que substituiria a cédula por um cartão plástico com chip no prazo de dez anos, mas, sem trocadilho, não saiu do papel.
O contrato de R$ 90 milhões com a Casa da Moeda deveria produzir 2 milhões de RICs, mas só 14 mil cartões foram emitidos. No ano passado o projeto foi "redesenhado". Não se sabe que formato terá o banco de dados nem que tecnologia empregará, só que o custo previsto é de R$ 6 bilhões em 12 anos.
Entra governo, sai governo, e o Planalto segue o mesmo. Arrecada cada vez mais e devolve cada vez menos para o cidadão, na quantidade e na qualidade dos serviços.
Nenhum comentário:
Postar um comentário