O GLOBO - 06/07
Ao contrário do que pensam alguns, a reforma política balizada por um plebiscito é perigosa. E o quadro não melhora se ela for feita por um Congresso constituinte
Em relação à tão falada reforma política, as certezas não têm durado mais de 24 horas. A esta altura, uma Constituinte exclusiva, reformas constitucionais feitas pelo atual Congresso ou um plebiscito já — propostos há pouco — são coisas velhas.
O mais provável é que se tenha simultaneamente às eleições do próximo ano um plebiscito sobre questões da reforma política. Depois, o novo Congresso formataria o aprovado. Mas isso é o provável hoje. Não se sabe até quando. Tudo pode acontecer. Até mesmo nada.
Mas, como o assunto está na ordem do dia, adianto algumas opiniões.
Primeiro, é ilusório pensar que reforma política porá fim à corrupção. Há políticos que roubam para fazer caixa de campanha. Mas há os que roubam para enriquecer. O que diminuirá a incidência dos crimes de colarinho branco é a punição efetiva de corruptos e corruptores, o que exige um Judiciário rápido, e não pirotecnias como transformar corrupção em crime hediondo.
O sistema político brasileiro é ruim e deve, de fato, ser reformado. Identifico-me com as propostas de financiamento público exclusivo para campanhas; voto proporcional em listas pré-ordenadas pelos partidos depois de uma prévia em que votem os filiados; e proibição de coligações nas eleições proporcionais. São propostas semelhantes às defendidas pela maioria dos que querem um plebiscito.
Mas é provável que esses pontos sejam derrotados. Isso deve ser levado em conta pelos defensores do plebiscito.
Imaginemos os adversários do financiamento público na TV: “Em vez de darmos dinheiro para políticos fazerem campanha, vamos usar os recursos para saúde e educação.” Não vai ser fácil convencer o eleitorado de que financiamento público é uma forma de moralizar, e não de sujar mais, o exercício da política.
Daí que é mais realista que os defensores do financiamento público sugiram a proibição de doações de empresas e a limitação para doações de pessoas físicas. Isso teria chances de ser aprovado. E seria um avanço.
Já para o voto em lista, necessário para fortalecer os partidos, não vejo perspectiva de vitória. É só imaginar os adversários da proposta dizendo: “Querem cassar do povo o direito de eleger seus candidatos, deixando isso para os caciques partidários.”
E mais grave seria a aprovação do voto distrital, em detrimento do voto proporcional — mesmo o que vigora hoje, com listas abertas. O atual sistema, ainda que seja pior do que o de listas preordenadas, é infinitamente melhor do que qualquer versão do voto distrital. Mas os defensores deste último dirão: “Ele vai permitir que o senhor vote em alguém de seu bairro, que poderá ser cobrado caso não cumpra as promessas.”
O voto distrital tornaria paroquial a disputa, impedindo a eleição de candidatos de opinião. Seria o pior dos mundos. O parlamento ficaria ainda pior. Ninguém mais se preocuparia com propostas gerais para o país, mas apenas com respostas a demandas locais, pois elas é que iriam permitir a reprodução dos mandatos.
Assim, ao contrário do que pensam alguns, a reforma política balizada por um plebiscito é perigosa. E o quadro não melhora se pensarmos que ela pode também acabar sendo feita por um Congresso constituinte eleito ano que vem. Ele não será diferente do atual e não precisará de maioria qualificada para aprovar algo. É um cenário preocupante.
Assim, a não ser que as ruas continuem a se fazer ouvir até 2014, é bom que os defensores da reforma política ponham as barbas de molho e tenham cuidado com as cascas de banana.
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