O Estado de S.Paulo - 30/05
Passado o aguardado 11.º leilão de concessão de áreas exploratórias de petróleo e gás, as atenções se voltam para o leilão em que serão ofertadas áreas promissoras para a exploração de gás não convencional.
O interesse pelo tema é potencializado pela bem-sucedida experiência dos EUA, cujo aumento da produção de shale gas barateou fortemente o preço do gás natural, atraindo investimentos, gerando empregos e ajudando o País a sair da crise em que estava desde 2008. As projeções mostram que os EUA caminham a passos largos na direção da autossuficiência, podendo, eventualmente, tornar-se exportador de gás natural. Enquanto isso, no Brasil, a indústria patina na falta de competitividade e o barateamento do gás está sendo visto como um "ovo de Colombo" capaz de recolocar nosso setor industrial no caminho do crescimento.
Mas replicar o fenômeno dos EUA não é tarefa simples e não basta ter as reservas. O sucesso americano é resultado de um conjunto de fatores políticos, institucionais, econômicos, ambientais, geográficos e tecnológicos que propiciaram um ambiente atrativo a investimentos em exploração e produção de gás não convencional. Desde os anos 70, o aumento da produção americana resultou do apoio do governo com políticas fiscais e incentivo ao desenvolvimento da tecnologia de fraturamento e da infraestrutura existente para escoar a produção. Todos esses fatores se potencializaram pelo mercado por meio do elevado nível dos preços do gás na década de 2000, gerando o atual boom de produção do shale gas no mercado americano.
No Brasil, pelo menos até agora, não temos legislação específica para o gás não convencional nem incentivos fiscais/financeiros que aumentem a atratividade do investimento. Também não há estudos completos e detalhados sobre as reservas, o que aumenta o risco das empresas que vierem para essa empreitada. Temos, ainda, desafios no que se refere à cadeia de suprimento para a nova atividade. Enquanto a distância entre poços de uma área típica de produção de gás convencional é de alguns quilômetros, no caso do shale é de apenas centenas de metros, por causa da baixa permeabilidade. Com isso será necessário um grande número de sondas que não estão disponíveis no mercado doméstico, que não tem dado conta nem mesmo de produzir as sondas necessárias para a exploração convencional. Além das sondas, há que se criar uma logística para que os demais insumos possam chegar aos campos de perfuração. O processo de fraturamento exige a mobilização de uma centena de caminhões para transportar areia, compostos químicos e muita água. O que deveria levar a uma avaliação, se a atual política de conteúdo nacional é apropriada para o gás não convencional. Tudo isso sem contar a infraestrutura de escoamento insuficiente, que inviabiliza a monetização das reservas de gás convencional da Bacia do Solimões, que já poderiam contribuir para a oferta doméstica.
Outro aspecto técnico que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) precisa considerar é o fato de os poços de shale gas apresentarem uma taxa de declínio muito acelerada, de 63% a 85% no primeiro ano de produção. Isso deveria levar a ANP a repensar duas questões: o prazo da concessão e o programa exploratório mínimo.
Ao comparar o Brasil com os EUA na questão da exploração e produção de gás não convencional, a conclusão é que faltam uma política de incentivo que viabilize o investimento no setor e uma definição sobre o papel e a atuação da Petrobrás. Ao contrário do mercado americano, onde há grande quantidade de empresas atuando em todos os segmentos da indústria do gás natural, no Brasil a Petrobrás é um monopólio vertical e horizontal, já que é a única produtora, importadora e transportadora e tem o monopólio da produção de todos os energéticos concorrentes ao gás natural. As reservas nós já temos. Se a produção vai se dar em 2 ou 10 anos, depende da vontade do governo de enfrentar os gargalos que prejudicam o mercado de gás no Brasil.
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