O GLOBO - 11/05
É deplorável a demonstração de descompromisso com as reais necessidades do país que tem sido dada pela base parlamentar do governo no encaminhamento da MP dos Portos. O último lance desta crônica de absoluta falta de bom senso, para dizer o mínimo, ocorreu quinta-feira, na tentativa de votação da matéria na Câmara, em que emergiram evidências da dura luta de lobbies de empresas e sindicatos travada em torno da questão, sem que em qualquer momento haja algum indício de preocupação com os graves gargalos existentes nos portos. Nem parece estar em questão um tema estratégico, do qual depende parte ponderável da capacidade de o Brasil ser competitivo num mundo cada vez mais globalizado, independentemente de crises.
A medida provisória, na versão original, é resposta adequada ao esgotamento dos efeitos positivos da Lei dos Portos, de 1993. Houve investimentos e melhorias no sistema, mas chegou a hora de mais avanços e, para isso, é necessário quebrar os cartórios que subsistem no setor.
Natural que haja reação. Sindicatos não querem abrir mão da exigência da contratação da estiva por meio dos Órgãos Gestores de Mão de Obra (Ogmos), uma modernização no início da década de 90, mas, hoje, fator de aumento de custos nos terminais.
O governo, com razão, deseja que os novos terminais, a serem licitados, possam contratar por meio da CLT, como qualquer empresa. Sindicatos e empresários reclamam, por se considerar futuras vítimas de “concorrência desleal”. Ora, que ajustem os custos. Há, ainda, o tema da renovação de concessões antigas. O risco, aqui, é mudar para que tudo continue na mesma, uma aplicação prática da máxima do príncipe de Falconeri, de Lampedusa. Se o objetivo das mudanças, uma nova abertura dos portos brasileiros, é estimular a eficiência pela competição entre os terminais, são necessários, de fato, novos atores neste mercado.
E não faltará carga para todos, à medida que os portos se tornem mais eficientes. E, por tabela, mais empregos — para tranquilidade dos líderes sindicais. Mas tem prevalecido a miopia da preservação de cartórios.
É impensável persistir o quadro atual, em que as vantagens competitivas que o país tem, por exemplo, no campo, se esvaem no transporte da carga e no embarque portuário. Apenas alguns dados do diretor-presidente do Movimento Brasil Competitivo, Erik Camarano: o frete no Brasil custa 15% do valor da carga, contra 6% nos Estados Unidos e 7% no Canadá.
Compreende-se por que os lobbies agem. Mas precisam ser contidos. E tudo depende do governo, que não controla a base parlamentar, e tem de enquadrá-la. Constituída à base do fisiologismo, a eclética base é movida a benesses e a interesses próprios, privados. Mas, até a semana que vem, quando a MP caduca, ela necessitará entender que o projeto de modernização dos portos transcende o varejo da política.
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