O Estado de S.Paulo - 01/04
Os crônicos problemas da telefonia no Brasil estão gerando situações esdrúxulas. Incapazes de fornecer serviços decentes, compatíveis com os preços que cobram e com os lucros que auferem, essas empresas também não cumprem a obrigação de atender a legião de clientes que têm queixas a fazer.
Resultado: os consumidores insatisfeitos têm pedido ajuda à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O volume de reclamações à Anatel é tão grande que a agência teve de ampliar seu call center, ao custo de R$ 17 milhões anuais, bancado com dinheiro público.
Conforme informou o jornal Valor (27/3), a Anatel promete cobrar essa conta das operadoras. "Não é correto que o contribuinte arque com os custos dos problemas que as próprias operadoras geraram", disse o presidente da agência, João Rezende. Nada mais justo. No entanto, a responsabilidade pelo descaso das operadoras em relação a seus clientes é também da Anatel, que foi incapaz, até agora, de fazê-las cumprir suas obrigações, a despeito de todo o barulho midiático gerado por multas, advertências e suspensão de serviços.
Os serviços de telefonia lideram as reclamações dos consumidores contra empresas. A primeira do ranking do ano passado, a Oi, chegou a receber cerca de 120 mil queixas. Em julho de 2012, a Anatel tomou a providência de impedir que a Oi, a Tim e a Claro, as três principais operadoras de celular do País e recordistas de reclamações, continuassem a vender seus pacotes de internet e de telefonia móvel em diversos Estados. Elas só puderam voltar ao mercado depois de se comprometerem a resolver os problemas que infernizam a vida dos clientes, como ligações que caem constantemente e a lentidão das conexões de banda larga. O mesmo aconteceu com a Vivo em 2009.
Ao recorrerem à Anatel, porém, os clientes mostram que as operadoras não tomaram jeito nem se intimidaram com as punições. Já são 30 mil queixas por dia na agência, um crescimento de 67% desde julho do ano passado, justamente quando a Anatel decidiu apertar um pouco as empresas. A partir desse momento, a agência passou a ser vista pelos consumidores como um canal para suas reclamações, não só sobre a qualidade do serviço, mas sobre a cobrança indevida de tarifas e a inclusão em pacotes que não foram contratados.
Além de ampliar seu call center, porém, a Anatel deveria fiscalizar com muito mais rigor, de modo a obrigar as empresas a melhorar a qualidade dos serviços e a fazer os investimentos que prometeram, de modo a justificar seus imensos ganhos. O principal nó do setor é a baixa qualidade da transmissão de dados 3G. A Anatel reconhece que há dificuldade de conexão nos horários de pico e que a velocidade e a estabilidade da transmissão estão muito abaixo das metas estabelecidas. Entre outros problemas, as antenas no Brasil têm capacidade dez vezes inferior às usadas nos Estados Unidos. Assim, parece precipitado falar em tecnologia 4G, já em uso nos Estados Unidos e na Europa e prometida para a Copa de 2014 no Brasil, se nem o serviço móvel 3G está plenamente desenvolvido no País.
Além disso, os consumidores foram estimulados a ter mais de um número de celular, ao adquirir planos de baixo custo, e isso sobrecarrega as redes. No final de 2012, a Anatel chegou a suspender algumas promoções das operadoras por temor de que o sistema não suportasse o tráfego de dados.
A Anatel afirma que está estudando maneiras de aprimorar o sistema de cobrança de multas, para reduzir a impunidade, e as empresas dizem que estão investindo bilhões de reais para melhorar os serviços. Promessas semelhantes foram feitas no passado, mas nada mudou, a julgar pela revolta dos consumidores.
Já são 260 milhões de celulares no Brasil, ou 132 aparelhos para cada 100 pessoas. Nenhum empreendimento dessa magnitude está livre de problemas, mas o que se espera é um comprometimento real das empresas e, principalmente, do governo para que os clientes das operadoras recebam exatamente o serviço pelo qual pagaram, nem mais nem menos.
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