terça-feira, março 12, 2013

Porta giratória na ANS - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 12/03

Órgão controlador do setor privado de saúde constitui bom exemplo dos equívocos do governo do PT no que toca às agências reguladoras


Quase 50 milhões de brasileiros confiam sua saúde aos planos privados de assistência médica. Embora paguem os impostos que mantêm o Sistema Único de Saúde (SUS), fogem do legendário mau atendimento para cair na malha de cerca de 1.300 operadoras particulares -da cruz para a caldeirinha, seria o caso de dizer.

O atendimento na rede privada -mercado em expansão, que já atrai interesse de investidores internacionais- é cada vez mais parecido com o do SUS, com muitas filas e empecilhos para realizar consultas e exames. Isso quando não ocorre a simples recusa de tratamento, em especial os mais complexos e caros. As reclamações à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) sobre negativas de acesso mais que dobraram entre 2010 e 2011, de 13.370 para 29.288.

Só em 2012 o setor passou a ser mais pressionado pela ANS, que em outubro suspendeu a comercialização de três centenas de planos. Mas o desempenho da agência reguladora ainda fica longe de representar eficazmente os interesses da população, como mostraram reportagens desta Folha.

O jornal se debruçou sobre 765 processos abertos por denúncias de irregularidades que foram julgados pela ANS em janeiro e fevereiro. Descobriu que 68% deles tramitavam havia cinco anos ou mais.

Como as regras para operadoras mudam a toda hora, muitos desses processos perdem o objeto antes de julgados e terminam arquivados. A ANS, que tem 1.185 funcionários, justifica a demora pela obrigatoriedade de seguir um processo legal, com várias fases de defesa e recursos, que depois podem dar ensejo a ações na Justiça.

Vários administradores da ANS provêm de altos cargos nas operadoras ou acabam voltando a trabalhar no setor, circulação apelidada de "porta giratória". Não surpreendem, em face de tal promiscuidade, episódios como o da suspensão voluntária de 109 planos pela Unimed Rio apenas um dia antes da divulgação dos que teriam a venda banida pela agência -de pronto acompanhada pelo pedido de registro de 40 novos planos.

Há quem associe isso ao fato de que, em 2010, 48 operadoras tenham repassado R$ 11,8 milhões para campanhas políticas. Segundo os pesquisadores Mário Scheffer (USP) e Lígia Bahia (UFRJ), os recursos doados a partidos aumentaram mais de 700% desde 2002.

Quando chegou ao governo federal, o PT bradava contra a "captura", por interesses privados, das agências reguladoras criadas pelo PSDB. Há dez anos no poder trabalha para tirar-lhes autonomia e loteá-las entre políticos. Os resultados da recaptura estão à vista, e não só nos serviços de saúde.


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