FOLHA DE SP - 03/12
As imagens que circularam pela internet eram embaraçosas e constrangedoras. Contra um fundo doméstico de ladrilhos brancos e móveis sem pretensão, a jovem olhava para os lados e hesitava em seu discurso, a que entretanto não faltava audácia.
Seguindo o exemplo da catarinense Ingrid Migliorini -que, não faz muito, leiloou a própria virgindade-, a estudante Rebeca Ribeiro, de Sapeaçu, a 155 km de Salvador, oferece em termos singelos a sua primeira noite.
"Quem der mais, leva... tipo assim, né", recita a jovem, num vídeo divulgado por computador.
As diferenças entre os casos de Ingrid e de Rebeca são tão notáveis quanto as semelhanças. Enquanto a jovem de Santa Catarina participou de um evento internacional, parte de um documentário australiano, é mais modesto o contexto social da moça de Sapeaçu. Tendo perdido o pai há três anos e com a mãe vitimada por um AVC, Rebeca vive da pensão de um salário mínimo. Situação econômica bem menos grave, em todo caso, que a de algumas meninas na Amazônia, cuja virgindade se perde com menos idade e a preço ínfimo (R$ 20, segundo revelou reportagem nesta Folha) nos prostíbulos miseráveis da selva.
Não é propriamente a necessidade econômica -muito menos a escravidão sexual no Pará ou no Amazonas- o que explica as decisões de Ingrid e de Rebeca. Tanto quanto o dinheiro, a sede de um bem ainda mais escasso -a celebridade- pode justificar a comercialização do próprio corpo, no primeiro caso. Estabelecido o precedente, o espírito de imitação e a falta de perspectivas vêm contribuir para a segunda versão.
Fica-se tentado, diante disso, a reagir de modo moralista, tanto na modalidade da reprovação religiosa à falta de castidade quanto na da crítica esquerdizante à mercantilização contemporânea.
Além de ser igualmente moralista o próprio apreço pela virgindade -que motiva os interessados a pagar tanto por tão ilusória conquista-, cabe sobretudo ver com tristeza, e não escândalo, a mentalidade que predomina nos dois lados da transação.
Por alto que seja o lance, é um momento único na biografia de uma mulher que, aqui, se vê destituído do próprio valor.
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