segunda-feira, dezembro 17, 2012
Impostômetro, jurômetro, mensalômetro - CLÓVIS PANZARINI
O Estado de S.Paulo - 17/12
A Associação Comercial de São Paulo desenvolveu interessante dispositivo eletrônico, conhecido por "impostômetro", que supostamente mede em tempo real a evolução da arrecadação tributária dos três níveis de governo. Sucesso de público e de crítica, ele mostra a cada segundo a mão leve do governo aliviando o bolso dos cidadãos brasileiros. Claro que a cachoeira de números que enfeita o display do aparelho não representa a efetiva entrada, a cada segundo, de receita tributária nos cofres da União, dos 26 Estados, do Distrito Federal e dos 5.561 municípios. Nem sequer o governo tem essa informação com tanta presteza. A apuração da efetiva arrecadação tributária nos três níveis de governo demanda meses de trabalho após o encerramento de cada ano.
O impostômetro, imagino, é uma espécie de ampulheta digital que derrama a cada segundo um grão da estimativa da arrecadação tributária mensal distribuída linearmente pelos 2.592.000 segundos de cada mês. Nem por isso o impostômetro pode ser considerado impostor. Essa teatralização do debate tributário tem importante efeito pedagógico e desperta na sociedade a percepção de que o governo custa caro.
A efetiva arrecadação tributária brasileira agregada de 2011 foi divulgada pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) em setembro deste ano, com a publicação do Balanço do Setor Público Nacional - 2011 (www.tesouro.fazenda.gov.br). A receita líquida (RL, descontadas as transferências a Estados e municípios) do governo federal, de acordo com a STN, somou R$ 817,9 bilhões. No período, gastaram-se com a Previdência Social R$ 281,4 bilhões (34,4% da RL) e com os juros nominais da dívida pública, outros R$ 180,6 bilhões (22,1% da RL). Para a saúde e a educação, a União destinou apenas 8,7% e 6,5%, respectivamente, de sua receita líquida.
Esses números assustam: de cada R$ 100 da receita líquida federal, R$ 56,50 esvaem-se pelos improdutivos ralos da Previdência Social e dos juros da dívida pública. No ano passado, o superávit primário (receitas menos despesas não financeiras) do governo federal, a sua "poupança" para honrar a dívida, foi de R$ 93 bilhões, suficiente apenas para pagar cerca de metade (51,5%) dos juros devidos.
Considerados os três níveis de governo, a receita líquida consolidada alcançou no ano passado R$ 1.578,1 bilhões, tendo a Previdência Social e os juros devorado, respectivamente, 20% e 14,8% daquele total. Com educação e saúde, os três níveis de governo gastaram apenas 13,8% e 12,3%, respectivamente, da receita líquida agregada. E com segurança pública, para alegria da bandidagem, gastaram apenas 3,4% daquele valor. O superávit primário agregado, exceto o das empresas estatais, foi de R$ 126,2 bilhões, suficiente para pagar apenas 54% dos juros nominais do setor público (R$ 233,5 bilhões, desconsiderados os das empresas estatais) no ano passado. O resto virou dívida nova. O governo entrou no cheque especial para pagar a fatura do cartão de crédito.
Mais importante do que amaldiçoar a carga tributária - moda do momento - é fiscalizar e exigir eficiência e decência no gasto público. Aquela é consequência deste, pois o setor público não deve arrecadar menos do que gasta, sob pena de ter de emitir dinheiro novo, o que significa inflação adicional, que dói mais do que imposto no bolso do povo. Ou aumentar a dívida, que exige mais esforço fiscal futuro. Simples assim.
Festejou-se, recentemente, a redução tributária concedida para automóveis e outros bens de consumo com o objetivo de aquecer a economia, mas essa generosidade do governo está sendo feita à custa de sacrifício do superávit primário, o que implicará nova dívida do governo. Ou melhor, da sociedade. Para o corrente ano, o governo federal acaba de confessar que o seu superávit primário (R$ 71,4 bilhões) será ainda menor do que o do ano passado. Esforços fiscais adicionais se anunciam. Com menos investimentos ou mais impostos...
Mais do que clamar por redução de impostos, é preciso que os cidadãos percebam que sai de seu bolso cada centavo que o governo gasta e passe a prestar mais atenção na qualidade da despesa pública. O "jurômetro", dispositivo análogo ao "impostômetro" criado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que supostamente mede em tempo real o dinheiro público vazando pelo ralo dos juros, é um passo adiante nesse sentido.
Seria interessante se fosse possível criar, também, uma espécie de mensalômetro, que mostrasse em tempo real o dinheiro público esvaindo-se para o esgoto dos mensalões, do inchaço da máquina estatal, do superfaturamento das obras públicas, das ONGs fajutas, das empreiteiras fantasmas, das garçonnières presidenciais e de outros malfeitos que cotidianamente nos assombram.
Talvez com isso os contribuintes-eleitores passassem a eleger melhores gestores públicos, criando-se assim condições para a redução dos impostos com responsabilidade fiscal. Sem cortes de despesa, o clamor pela redução da carga tributária soa pueril.
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