O GLOBO - 17/10
Discussão sem sentido é a que mobilizou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, de um lado, e o presidente do Fed, Ben Bernanke, do outro. É evidente que todos têm razão. Tanto as políticas monetárias expansionistas dos EUA têm impacto no mercado de moedas quanto a recuperação norte-americana será melhor para mundo.
Se o Fed nada fizesse para resolver a crise de crédito americana é que o mundo estaria realmente encrencado. Os Estados Unidos ainda são a maior economia do planeta e a que tem o maior déficit comercial, encomenda bens e serviços de países do mundo inteiro. A dosagem das emissões monetárias do banco central americano parece às vezes exagerada, sem dúvida, mas imagine se nada tivesse sido feito pelo Fed desde o começo desta crise?
O que preocupa Ben Bernanke sempre foi o fantasma da depressão, e ele assumiu disposto a entrar para a história como o presidente do Fed que evitou a repetição do evento econômico que assombrou os EUA nos anos 30. Acabou desatento aos riscos de outros desequilíbrios que cobrarão a conta mais tarde.
O ministro Mantega criticou no FMI a política monetária norte-americana. Recentemente, como se sabe, o Fed decidiu pela terceira injeção de recursos na economia através da compra de títulos lastreados em hipotecas, em US$ 40 bilhões por mês. Nas hipotecas está o caroço inicial da crise que desde 2008 tem produzido a desordem que o mundo tem enfrentado.
Bernanke reagiu, dizendo que tudo tem sido feito para elevar o ritmo da economia americana, o que tem reflexo positivo na economia mundial. Para ele não é claro que a política monetária de estímulo da instituição prejudique os países emergentes. Mas a desvalorização do dólar, de fato, aumentou a competitividade dos produtos americanos prejudicando o comércio com outros países.
O Brasil sentiu mais o impacto. O que era superávit virou déficit com os Estados Unidos. No ano passado, chegou a US$ 8 bilhões, e neste ano está em US$ 3 bilhões até setembro. Mas o comércio bilateral sofreu também pela falta de iniciativa brasileira para buscar o mercado americano. A proporção das exportações brasileiras que vão para os Estados Unidos despencou. Nem tudo é câmbio. Empresários ouvidos pelo Valor dizem que é preciso ter uma política de mais facilidade de negócios e mais acordos entre os dois países. E são presidentes de empresas grandes, como a Embraer e Coteminas.
Tombini rebateu Bernanke dizendo que a política monetária prejudica, sim, as políticas macroeconômicas brasileiras. Segundo ele, a entrada excessiva de capital “dificulta o controle da inflação”. Bom, aí fica difícil concordar. Se há um efeito positivo da valorização da moeda local é tornar mais fácil controlar a inflação. Desequilibra o comércio, mas derruba preços de produtos afetados pela cotação do dólar. Ele poderia dizer que essa não é a melhor forma de combater a inflação já que desorganiza a produção, mas o país só não estourou a meta em 2011 porque houve a “ajuda” do dólar baixo. Em alguns setores, chegou a haver deflação, atenuando o impacto da elevação de outros preços.
Segundo Tombini, o impacto inflacionário do fluxo de capitais ocorre porque ele produz “crescimento do crédito”. Ora, quem tem feito um enorme esforço para manter alta a oferta de crédito é o próprio governo brasileiro. O BC chegou a liberar compulsório para se criar crédito para compra de automóveis. O Banco Central deveria ver onde tem errado, já que do Ministério da Fazenda não se tem muita esperança de uma autocrítica.
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