O GLOBO - 19/08
Iniciado o julgamento do mensalão, pode-se dizer que a decisão se dará em três atos. O primeiro ato diz respeito ao que foi provado. Há fatos e há versões; há testemunhas que se contradizem; há milhares de documentos. Acusação e defesa apresentaram narrativas apoiadas em provas.
Na maioria dos casos, há consenso sobre os fatos (como a ocorrência de pagamentos, contratos, subcontratações, reuniões etc.). Segue daí que os ministros ligarão os fatos às pessoas. Cada um dos ministros dirá quais provas e qual narrativa foram mais convincentes no tocante à autoria e participação das pessoas envolvidas em cada episódio. Uma testemunha pode convencer o juiz mesmo que outras dez digam o oposto; o depoimento do desafeto e do corréu podem ter menos valor; provas técnicas podem se sobrepor à testemunhal. O que vale é a convicção do juiz, desde que apoiada em uma prova válida, conforme dispõe o artigo 155, do Código de Processo Penal.
E aí começa o segundo ato — talvez o mais esperado pelos juristas. Provado o pagamento de valores a deputados e partidos para apoio político, aplicam-se penas do crime de corrupção ou de caixa dois? O recebimento de valores por meio de empresas de terceiros é uma forma de lavagem de dinheiro? E se for por meio da esposa do réu? A subcontratação de 99% do valor total do contrato de licitação é uma forma de fraude?
A importância do segundo ato é enorme. Os efeitos são imediatos não apenas para os réus. A decisão do Supremo definirá a jurisprudência para todos os juízes do país. Em raríssimas situações o Supremo teve oportunidade de atuar como juiz de primeiro grau. Há o risco de que um tribunal acostumado a corrigir erros de outros juízes cometa, ele próprio, equívocos comuns a quem está tão próximo do calor do processo?
O último ato será a dosimetria das penas, caso haja condenações. Como as penas variam muito é preciso individualizar a punição. Serão consideradas a personalidade, conduta social, antecedentes e a reprovabilidade da ação de cada réu. Também os motivos, circunstâncias e consequências do crime. Tudo isso para que a pena de cada eventual condenado seja individual, e não um castigo coletivo. Ao final, a população terá condições de conhecer exatamente quem, quando, como e por que fez o quê, entender como nossas leis e instituições funcionam, qual a punição para cada condenado.
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