O GLOBO - 14/07
A desmontagem do esquema de corrupção construído no Ministério dos Transportes a partir de 2003, quando o então presidente Lula doou a Pasta a futuros fundadores do PR, ajudou a criar a ideia da "faxina ética" em torno da presidente Dilma.
No arrastão de demissões, no ano passado, tiveram destaque o próprio ministro, Alfredo Nascimento, senador pelo Amazonas, presidente do partido, e o poderoso diretor-geral do Dnit, Luiz Pagot, responsável pela assinatura de contratos de obras e - tão ou mais importante - acertos em torno dos famigerados aditivos contratuais. Mas só depois de carimbados no balcão de negociatas montado no ministério pelo partido e entregues, segundo as denúncias, à gerência do indefectível Valdemar Costa Neto (PR-SP), mensaleiro, obrigado a renunciar ao mandato para escapar à cassação e voltar à Câmara na eleição seguinte.
Na época, ficou em segundo plano o presidente demitido da Valec, estatal de construção de ferrovias, vinculada ao ministério, José Francisco das Neves, o Juquinha, no cargo desde o primeiro ano da gestão Lula. Mas hoje não só Juquinha frequenta também o noticiário policial gerado pela corrupção, como a Valec virou símbolo de como a incompetência e a corrupção podem prosperar numa empresa estatal. Na Valec, sob a batuta de Juquinha, essas duas características observadas na área pública se somaram à perfeição.
Juquinha, também parceiro de Costa Neto neste ramo do Executivo federal, foi preso no início mês, acusado de praticar fraudes, e de se beneficiar delas, em licitações de obras em trechos da Ferrovia Norte-Sul, um projeto que se arrasta há duas décadas, outro monumento à incúria estatal. A Operação Trem Pagador - nome bem escolhido -, executada pela Polícia Federal em Goiás, atingiu também Marivone Ferreira das Neves e Jader Ferreira das Neves, mulher e filho de Juquinha, beneficiados pelo estonteante aumento de patrimônio do ex-presidente da Valec.
Algo digno de um desses gênios empreendedores do mundo digital: o valor dos bens de João Francisco, apenas os já identificados até agora, chega a R$ 60 milhões, bem mais que o R$ 1,5 milhão declarado por Juquinha em 2003, ao assumir a Valec. A contrapartida da gestão predatória é, como sempre, enorme prejuízo para a sociedade.
José Eduardo Castello foi nomeado para a Valec no fim do ano passado e instalou auditorias na obra da Norte-Sul, para levantar a dimensão do estrago. Foi inspecionada, segundo o jornal "Valor", a maior parte dos 855 quilômetros do trecho Sul, entre Palmas (TO) e Anápolis (GO). Apenas em estruturas e trilhos mal instalados será feita uma despesa adicional de R$ 400 milhões, ou quase meio bilhão de reais.
Em pelo menos 210 quilômetros serão necessárias obras corretivas, portanto em 25% do trecho. Erros graves se distribuem por cinco lotes, representando metade dos 855 quilômetros da ferrovia.
É um grande escândalo dentro de um outro, o próprio aparelhamento feito no Ministério dos Transportes para fins pecuniários e também de nepotismo (um filho do ex-ministro Alfredo Nascimento virou empresário de sucesso). A Valec mereceria uma investigação ampla e profunda, por ser emblemática do que pode acontecer quando o fisiologismo toma de assalto o Estado.
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