O GLOBO - 03/06
Lula tem uma infinita fé no seu taco. Já transformou greve derrotada em vitória política. Em 2008 jogou o peso de sua presidência pedindo à população que consumisse, no auge da depressão mundial. Acertou e prevaleceu. Em janeiro passado deixou-se atrair pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, que parecia disposto a aliar-se ao PT na eleição de outubro, apoiando a candidatura do ex-ministro Fernando Haddad. Lula contrariou uma parte de sua base e, sobretudo, a senadora Marta Suplicy. Passou-lhes o rolo compressor do Guia Genial dos Povos e armou até mesmo uma entrada triunfal de Kassab na cerimônia do 32 aniversário do PT. Um mês depois o prefeito aninhou-se com o tucanato. Consagrou sua fama de articulador com um título raro: passara a perna em Lula, que ficou com a carga de lutar pela eleição de um poste no qual deverá até mesmo atarraxar a lâmpada.
Ao encontrar-se com o ministro Gilmar Mendes para tratar do mensalão, com direito a comentários impróprios sobre juízes do STF, Lula sabia que corria riscos. Confiou no que supunha ser uma relação recíproca de amizade. (Nosso Guia e o ministro têm uma relação de afeto ofídico.) Deu no que deu. Essa autoconfiança vem de longe, do tempo em que, no meio de uma crise, ao fim de uma reunião com empresários, um deles pediu-lhe um autógrafo, pois prometera-o a um filho.
Em cinco meses, duas bolas fora, em casos onde prevaleceu o que acreditava ser o seu instinto infalível. No episódio de Kassab, pode ter atrapalhado o próprio partido, nada mais que isso. No de Gilmar Mendes, transbordou, e o encontro dos dois só serviu para criar um clima de feijoada no Supremo Tribunal Federal. Lula fez seu périplo pelos ministros sem discutir a tática com os réus do mensalão, ou com seus advogados. Quis levar a coisa no peito. A esta altura da vida, não é de se esperar que mude, mas seria o caso de ele próprio se perguntar se não está exagerando. Como ele já disse: "Quando a gente pensa que vira vanguarda, vira mesmo é desastre".
Ele
Durante a campanha eleitoral, quando um de seus amigos começou a dizer bobagens, ele o procurou, pedindo que ficasse calado. Mais: antes da gestão pessoal, mandara um intermediário oferecer um bom dinheiro para calá-lo.
Quando ele é apanhado num erro, culpa os outros, preferencialmente a imprensa. Velhos companheiros garantem que se trata de um megalomaníaco, que só acredita em si, craque numa campanha, medíocre na administração.
Ele é Barack Obama, segundo o livro "The Amateur" (o e-Book está por US$ 9,99), do jornalista americano Edward Klein, que disparou para o primeiro lugar na lista de mais vendidos do The New York Times.
O amigo que dizia bobagens era o pastor Jeremiah Wright. O dinheiro (US$ 150 mil) foi oferecido por Eric Whitaker, que ainda hoje é um dos mais próximos conselheiros pessoais do companheiro.
Fé no taco contagia
A cadeira do ministro da Fazenda, Guido Mantega, já teve diversos tipos de ocupantes. Havia os que falavam pouco (Pedro Malan e Octavio Gouvêa de Bulhões), dois mestres da arte de falar para dar a entender (Delfim Netto e Mario Henrique Simonsen) e os que falavam o que não deviam (Rubens Ricupero e Ciro Gomes). O ministro Guido Mantega esteve no primeiro grupo, habilitou-se ao segundo e está escorregado para o terceiro.
Outro dia, ele exigiu que a banca reduza os juros em até 40%, deu um prazo de 30 dias e informou: "Eu vou cobrar. Em mais um mês, tudo isso tem que estar rodando". Mantega sabe que não é assim que se faz e, se faz assim, está fazendo outra coisa. Acredita que pode transformar o ministério num comissariado que dá ordens ao mercado. Ou, numa versão benigna, acredita que pode dar essa impressão.
Mantega fez um trabalho exemplar baixando a crista da banca na discussão das taxas de juros, mas nunca fez ameaças, com metas e prazos. A diferença está no detalhe mandão. Se o ministro da Fazenda acha que pode dominar o mercado financeiro ameaçando-o dessa forma, de duas, uma: ou não consegue e se desmoraliza, ou consegue e acaba acreditando que é o rei do pedaço. Mais adiante, virá a conta. Houve uma época em que a banca mandava na ekipekonômica, pensar que se pode construir um modelo onde ocorra o contrário também não dá certo.
Haja museus
O Instituto Brasileiro de Museus organizou uma semana de atividades, editou um catálogo e nele listou pelo menos 43 museus no eixo Rio-Petrópolis-Niterói.
Os museus diferenciam-se no tamanho e no acervo, mas todos têm diretores e funcionários. Quando faltam estruturas, roubam-se peças, e assim sumiu um Matisse da Fundação Castro Maya. Ele reapareceu na Rússia.
A rede oficial de Roma tem 20 museus. No Vaticano, há mais sete; contando-se a Capela Sistina, as Salas de Rafael e a Biblioteca Apostólica, são dez. Total: 30.
Muitos diretores e poucos acervos, os males dos museus brasileiros são.
Transparência
O professor Delfim Netto está panfletando uma nota oficial da American Economic Association anunciando sua nova política de transparência. A partir do dia 1 de julho, todos os trabalhos oferecidos para publicação deverão informar:
1) Quem financiou a pesquisa.
2) Cada autor deverá identificar todas as suas fontes de apoio financeiro, inclusive por prestação de "serviços de consultoria".
3) Cada autor deverá listar suas funções, remuneradas ou não, em instituições que tenham qualquer relação com os temas tratados no artigo.
4) Os sábios deverão contar se submeteram os seus artigos à leitura de outras partes.
5) A AEA colocará na rede informações sobre potenciais conflitos de interesses relacionados com artigos já publicados.
Delfim está certo de que, se essa política for acompanhada por outras instituições, boa parte dos sábios do mercado cairá em profundo silêncio.
Bola de cristal
Para quem tenta ver nas pesquisas de hoje o resultado da eleição americana de novembro, o professor Larry Sabato, do site "Crystal Ball", adverte: "É melhor jogar cara e coroa".
O companheiro Obama está na frente, por pouco, mas tudo o que se pode dizer é que a eleição será apertada. Por quê?
Porque, em junho de 2006, John McCain estava um ponto à frente de Obama. Em 2002, o senador John Kerry estava seis pontos à frente de George W. Bush. Al Gore liderava em 1998 e, em 1992, o campeão de junho, Ross Perot, acabou em terceiro. Em 1988, Michael Dukakis batia Bush 1 por 52% a 38%.
As pesquisas de junho só foram confirmadas nas reeleições de Bill Clinton, em 1996, e de Ronald Reagan, em 1984.
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