domingo, maio 13, 2012
O procurador-geral fabricou uma crise - ELIO GASPARI
O GLOBO - 13/05/12
Numa época em que surgiu o ofício de "gerenciador de crise", o procurador-geral Roberto Gurgel se tornou um fabricante de encrenca. O doutor sobrestou a Operação Vegas da Polícia Federal, que expunha relações do senador Demóstenes Torres com Carlinhos Cachoeira durante três anos. Em março, quando outra investigação detonou a quadrilha, Gurgel representou ao STF contra o senador. Conhecem-se duas explicações de sua conduta. Uma, apresentada numa nota oficial, informa que ele "optou por sobrestar o caso, como estratégia para evitar que fossem reveladas outras investigações". Noutra, contada pelo delegado que chefiou a Vegas, a subprocuradora-geral Claudia Sampaio (casada com Gurgel) disse-lhe que não foram encontrados elementos suficientes para a abertura de um processo. Diante das cobranças para que se explique melhor, Gurgel tumultuou o debate: tudo seria coisa de "pessoas que estão morrendo de medo do julgamento do mensalão". Há gente com medo do desfecho do mensalão, é até possível que essas pessoas queiram azucriná-lo, mas a questão continua do mesmo tamanho: ele segurou a Operação Vegas. Pode tê-lo feito pelos melhores motivos, mas suas explicações ainda não satisfazem quem queira entendê-los. Em sua representação de 2012, Gurgel valeu-se de 22 gravações que estavam no inquérito que recebeu em 2009. O doutor não quer ir à CPI e tanto o ministro Joaquim Barbosa como seu contemporâneo Gilmar Mendes, do STF, dão-lhe razão.
Quando uma CPI é instalada, começa a funcionar um filtro subjetivo que destaca aqueles que não querem depor ou se movem para bloquear depoimentos. Por exemplo: o PT não quer que o governador Agnelo Queiroz vá à CPI, já o PSDB, não quer que chamem o governador Marconi Perillo e o PMDB quer evitar a convocação de Sérgio Cabral. Gurgel não faz parte desse plantel, mas decidiu juntar-se a ele.
A CPI de Cachoeira difere de todas as outras, que começaram com perguntas para desembocar em inquéritos. Ela começou com um inquérito, onde estão quase todas as respostas. Até agora, o que se vê é uma teologia da blindagem para evitar novas perguntas. Felizmente, a couraça da quadrilha de Cachoeira foi furada pela Polícia Federal com seus grampos.
D. Renan
O senador Renan Calheiros não tem assento na CPI do Cachoeira, mas destacados membros da Comissão têm assento na antessala de seu gabinete.
Quem o viu em 2007, quando renunciou à presidência do Senado no meio de um escândalo onde não faltava um empreiteiro, pode constatar o efeito rejuvenescedor do poder.
Nova tática
O comissariado do Planalto achou que podia deixar a CPI do Cachoeira andar sozinha. Achava que teria pouco a temer, além do pescoço de Agnelo Queiroz.
Em uma semana e com o surgimento da Operação Delta-JBS (leia-se JBS-BNDES-Delta), decidiu organizar sua tropa.
Novo tempo
Em julho de 2003, a taxa básica de juros estava em 26,5%, nos cheques especiais ia a 142,2% e os 50 maiores bancos lucraram R$ 5,7 bilhões, enquanto as 150 maiores empresas industriais conseguiram R$ 3 bilhões.
Abriu-se uma discussão em torno dos juros e dos spreads bancários. O Banco Central saiu em defesa da banca com uma cartilha de 27 páginas, explicando que nada havia de estranho naqueles números. Era o livre mercado em funcionamento.
Mudou o Brasil, e o Banco Central conseguiu ficar independente. Não sai mais em defesa dos banqueiros.
O BC destruiria a carta de Caminha
O doutor Alexandre Tombini, presidente do Banco Central, sustenta que as posições individuais dos membros do Comitê de Política Monetária, que decide a taxa de juros Selic, devem ficar em segredo.
Tem toda razão. Se as atas do Copom derem nome aos bois, os diretores do BC sofrerão pressões impertinentes.
Bem outra coisa é manter sob sigilo eterno essas discussões. Desde 1976, as reuniões do Copom americano são gravadas e, desde 1994, são divulgadas, respeitando-se um embargo de cinco anos.
Sigilo é uma coisa, inimputabilidade é outra. O que se busca com o silêncio do Copom é a inimputabilidade dos diretores do BC. Os doutores são mais secretos que os generais do Alto Comando do Exército durante os dez primeiros anos da ditadura. Até 1974, suas reuniões eram gravadas. A partir de então, o general Sylvio Frota mandou que a máquina fosse desligada quando as discussões não tratassem de assuntos militares.
Graças a esse gravador, conhecem-se as atas da anarquia militar de 1969, quando os generais discutiam a sucessão do presidente Costa e Silva. Se o Banco Central tivesse gravado as reuniões de 1998, a choldra conheceria a anarquia financeira do colapso do populismo cambial tucano.
El Rey D. Manuel considerava secretos os mapas e documentos das navegações. Se a coroa portuguesa trabalhasse com as regras do BC, a carta de Caminha teria sido destruída.
Cavalos e a banca
De um conhecedor de cavalos e de banqueiros:
"A Febraban disse que ''você pode levar um cavalo para a beira de um rio, mas não pode obrigá-lo a beber água''. De cavalos eles não entendem. Se você salgar a aveia, o bicho beberá a água. Prova disso é que, no dia seguinte, diante da irritação do governo, retrataram-se. Dilma Rousseff salgou-lhes a ração."
Tremenda história
Está nas livrarias "No Jardim das Feras - Intriga e Sedução na Alemanha de Hitler", do americano Erik Larson. É boa leitura, sobretudo numa época de crise econômica com surtos xenófobos, quando uma parte do mundo extasia-se com uma potência econômica que faz grandes obras de infraestrutura e mantém o povo quieto.
O jardim de Larson é a Berlim de 1933, com suas noites feéricas. As feras tinham tomado o poder. No meio disso tudo, o presidente Roosevelt jogou, como seu embaixador, o historiador William Dodd, um homem frugal que pretendia usar o tempo para escrever mais um livro. Junto, veio sua filha Martha, bonita, namoradeira e frívola.
Primeiro o Larson mostra como a vida seguia, com boas festas e, achava-se, alguns excessos. A metamorfose de Dodd, a ponto de se tornar um estorvo para os nazistas e para o Departamento de Estado, com sua bancada pragmática e antissemita, é contada magnificamente. Quando parece ser impossível que semelhante enredo contenha mais surpresas, Larson conta a história de Martha e de sua amiga Mildred, guilhotinada em 1943. Ela morreu em 1990, aos 82 anos.
Privataria petista
O repórter André Borges informa que, no escurinho do cinema, o comissariado do Planalto prepara a prorrogação das concessões de 1.482 quilômetros de rodovias entregues pelo tucanato a seis empresas, entre 1994 e 1997.
A prorrogação de concessões envolve, necessariamente, um acerto em relação ao contrato original. Às vezes, esse acerto é feito por dentro, às vezes, é feito por fora.
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