sábado, maio 19, 2012

Comissão parlamentar em foco - WALTER CENEVIVA

FOLHA DE SP - 19/05


Se o Congresso se dispuser a apurar condutas irregulares, será possível o encontro da verdade


DOIS FATOS legais chamam nossa atenção nestes dias. O primeiro, sobre o mensalão, com a denúncia pelo Ministério Público a ser julgada no STF (Supremo Tribunal Federal). A preocupação maior está na esperança de ver inocentados os inocentes e punidos os culpados, no julgamento pela Justiça, sem que ninguém seja beneficiado pela prescrição de delitos comprovados. O segundo fato é o da comissão parlamentar, no começo de seus trabalhos, ainda centrados nas relações do duo Demóstenes e Cachoeira, com as dúvidas noticiadas. A agitação política tende a perturbar a compreensão da população, com a pluralidade das versões proclamadas.

Paira no ar o perigo da prescrição, no primeiro caso. No segundo, a semana tratou o rol dos envolvidos e dos liberados por acertos políticos. Não há deficiência da lei. A norma constitucional, reguladora das comissões parlamentares de inquérito, é rigorosa. Observada por inteiro, mesmo com a presença de membros dos partidos dos acusados, há meios para chegar à verdade, se afastada a política pela maioria.

No trabalho das comissões parlamentares permanentes (Constituição, art. 58), o andamento é geralmente estranho à atenção pública, mesmo sendo formadas sob o critério essencial de acolher "tanto quanto possível a representação proporcional dos partidos ou dos blocos parlamentares" em cada Casa do Congresso.

A comissão parlamentar de inquérito não é permanente. No passado os interesses políticos preponderavam, pondo dúvida sobre a seriedade do Poder Legislativo, levado, muitas vezes, pelas pressões externas. Em meu livro "Direito Constitucional Brasileiro" (Saraiva, 475 páginas) escrevi que "distintas das comissões ordinárias, as comissões parlamentares de inquérito, demais dos poderes investigatórios próprios das autoridades judiciais, têm outros, especiais e compatíveis com sua finalidade, previstos no regimento interno da Casa respectiva".

A expressão "poderes investigatórios próprios das autoridades judiciais" aponta a predominância da ação de levantar fatos e identificar seus autores, respeitada a ampla defesa e assegurado o contraditório, para identificar os culpados e preservar os não culpados. Tudo sob as regras do direito. Exemplo: na jurisprudência ficou admitido que a testemunha compromissada em dizer a verdade pode omiti-la ou manter-se em silêncio para não revelar fato que a incrimine. É um direito constitucional do interrogado.

O poder investigatório das comissões é limitado a fatos determinados. No livro mencionado escrevi que "se no trabalho investigativo afloram irregularidades não relacionadas com os elementos justificadores de sua criação, outra ou outras comissões poderão ser formadas para os averiguar. A requisição de informações bancárias e a quebra do sigilo incluem-se no rol dos direitos fundamentais". É bom que seja assim, por mais decepcionantes que sejam os acertos políticos dos interessados.

As regras constitucionais dão garantia de que, se o Congresso se dispuser a apurar condutas irregulares, será possível o encontro da verdade, para separar o joio do trigo e elogiar a apuração de culpas e inocências. Se houver erros ou distorções, a culpa será dos aplicadores da lei e não da própria lei.

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