CORREIO BRAZILIENSE - 10/03/12
A esperteza não tem limites. Na terça-feira passada, líderes partidários garantiram a este Correio que são contra o recebimento do 14º e do 15º salários no Senado. Da boca para fora, todo discurso vale. Mas ladainhas guardam sempre uma contradição: durante longos 13 meses, um projeto para acabar com os rendimentos extras dos parlamentares ficou perdido na burocracia do Congresso.
O destino do projeto esquecido pelos senadores, entretanto, começou a mudar na quarta-feira passada. O presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), o petista Delcídio Amaral, garantiu que o texto — de autoria da senadora licenciada e hoje ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann — entrará na pauta no próximo dia 20, ou seja, daqui a 10 dias. É uma contagem regressiva para o cidadão.
Na iniciativa privada, salários extras são pagos a funcionários como bônus por conta dos resultados. Tal coisa, entretanto, não é regra. E, de mais a mais, o benefício não sai do bolso do contribuinte. Portanto, a questão é se o cidadão está disposto a pagar a conta para os parlamentares embolsarem o 14º e o 15º salários. Mas, como se sabe, quem vai decidir tal coisa são os atuais beneficiados.
A regalia dos parlamentares foi criada em 1995 com a “nobre” intenção de pagar o custo da mudança dos parlamentares, dos estados de origem para Brasília. O problema é que o 14º e o 15º são pagos todos os anos. Foi incorporada ao contracheque. Há alguma justificativa decente? Segundo a assessoria do Senado, a “ajuda de custo” não pode ser considerada salário por ter “caráter indenizatório”.
Para Gleisi Hoffmann, o benefício perde o sentido ao ser embolsado todos os anos. Segundo ela, os parlamentares só devem ter direito a dois salários, um no início e o outro no fim do mandato. Pronto. Aí, sim, o “caráter indenizatório” do benefício estaria confirmado. Se aprovado, o projeto de Gleisi será remetido à Câmara. E, é claro, valerá também para deputados federais, que embolsam os extras.
Jornalismo
Reportagens deste Correio ao longo do último mês de fevereiro mostraram o absurdo do 14º e do 15º salários na Câmara Legislativa. Depois de controvérsia, os distritais votaram um projeto até então esquecido, e que previa o fim do benefício. Sob fortes protestos de alguns, decidiram acabar com a farra. O foco das reportagens a partir daí mudou para a Câmara dos Deputados e o Senado.
E aqui mais um absurdo, como se não bastasse. Descobriu-se que, além de receberem os dois salários extras, deputados federais e senadores — além dos nossos distritais — não declararam o rendimento ao Fisco. O que era imoral, o recebimento dos salários, transformou-se em algo ilegal, a suposta sonegação. Uma investigação da Receita acabou aberta contra o Senado para multar parlamentares.
O prazo de explicações dos senadores ao Fisco acaba no próximo dia 27, uma semana depois da votação da validade dos salários na Comissão de Assuntos Econômicos. A sessão e os votos são abertos, mas podem acabar secretos caso um dos nossos parlamentares apresente um pedido para tal coisa e consiga convencer os colegas. Seria uma trapaça com o contribuinte brasileiro.
Afinal, alguém ainda duvida de que é preciso acabar com a imoralidade e a ilegalidade do 14º e do 15º?
Outra coisa
A sessão “beija-mão” marcada para o senador Demóstenes Torres se explicar sobre a relação com o empresário Carlinhos Cachoeira entrará para a história. Pela porta dos fundos, evidentemente.
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